01/07/2012 - 0:00
No início de junho, cruzes pretas fincadas em baias que deveriam ser ocupadas por suínos provocava espanto e choque em quem passava pelo parque de exposições de Barra do Norte, município-sede da 9ª Feagro, uma das mais importantes feiras agropecuárias de Santa Catarina, a 140 quilômetros de Florianópolis. Cruzes, no lugar dos animais, foi a forma encontrada pelos criadores do Estado para protestar contra os altos custos de produção e os preços, em queda, que estão recebendo da indústria. Mas, essa equação indigesta para quem produz, não é um problema exclusivo dos suinocultores catarinenses. Hoje, ele também atormenta os gaúchos que temem, inclusive, dar entrevistas por medo de retaliações dos bancos que financiam o setor. Procurado pela reportagem da DINHEIRO RURAL, um dos maiores criadores de suínos do meiooeste do Rio Grande do Sul disse que falaria, desde que o seu sobrenome não fosse divulgado. Segundo Mauro, como quer ser identificado, recentemente um banco negou-lhe crédito, em represália a uma entrevista a um jornal da região. “Disseram que a minha propriedade estava à beira de um colapso”, afirma Mauro, que produz 120 mil animais por ano. “De fato, minhas reservas hoje estão em baixa e tem sido penoso cobrir a diferença entre o custo de produção, de R$ 2,50 o quilo, e o que consigo na venda do suíno vivo, de R$ 1,70 o quilo, nos últimos meses.” Com isso, desabafa, está difícil manterse na atividade.
Os suinocultores catarinenses realizaram protesto durante a Feagro 2012.
O Brasil conta com 2,4 milhões de porcas produzindo leitões. Santa Catarina e Rio Grande do Sul são os dois principais berçários com, respectivamente, 396 mil e 313 mil matrizes suínas, quase 30% do plantel nacional. Em maio, o preço médio do suíno nesses dois Estados, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/USP), de Piracicaba (SP), foi de R$ 1,94 o quilo. No fim de Junho estava em R$ 1.74. Entretanto, essa cotação considera também os produtores integrados às indústrias, que pagam um valor mais elevado pelo quilo do suíno. “Na verdade, muitos produtores receberam até menos de R$ 1,70 pelo quilo vivo”, diz Camila Ortelan, pesquisadora do Cepea. “A situação dos gaúchos é bem complicada.” Mas, por enquanto, o número de criadores no Rio Grande do Sul, em torno de nove mil, tem se mantido estável, garantindo uma produção de 7,2 milhões de animais por ano. Ao contrário de Santa Catarina, onde a situação é alarmante. Segundo a Associação Catarinense de Criadores (ACCS), na média, o custo do suíno vivo está na faixa de R$ 2,65 o quilo. “Por causa do descompasso entre custo e receita, cerca de um mil criadores deixaram a atividade, no ano passado”, diz Losivanio Lorenzi, presidente ACCS. Hoje, eles não passam de oito mil produtores, responsáveis pela criação de 6,6 milhões de animais por ano. “A situação em Santa Catarina é caótica e vamos perder mais produtores com essa crise”, diz Lorenzi. Entre aqueles que já pensam em deixar a atividade está Rubens Antonio Comelli, da Agropecuária Comelli, no município de Iomerê, no meio-oeste catarinense. Comelli vende 80 mil animais por ano, dos quais 40 mil são de criação própria e os restantes são fornecidos por 100 criadores de leitões da região. “Neste ano, vou reduzir minha produção em 20%”, diz Comelli. “E caso a crise se acentue, vou parar de comprar leitões.”
ABANDONO: Lorenzi, da ACCS, diz que mais de mil criadores de suínos de Santa Catarina já deixaram a atividade
Comelli participou, no dia 11 de junho, de uma reunião realizada em Iomerê, entre o governador do Estado, Raimundo Colombo, e cerca de mil suinocultores de várias regiões de Santa Catarina. No encontro, o grupo fez dois pedidos ao governador. O primeiro foi a isenção do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para o setor. O segundo, que o governo pleiteie formalmente ao ministério da Agricultura o subsídio para o preço do milho, a principal fonte de alimento dos animais. “O governador disse que tentaria nos ajudar e já decretou estado de emergência para a suinocultura”, afirma Comelli. “Se nada mudar, em 90 dias, entraremos em estado de calamidade pública. Vamos falir.”
Otimista, o governador catarinense, que esteve na 9ª Feagro – o evento das cruzes pretas, em Barra do Norte – rebate o pessimismo dos produtores. Segundo ele, o Japão estava prestes a abrir o seu mercado para o suíno brasileiro e, com isso, a situação dos produtores poderia melhorar. Não é o que pensa Pedro de Camargo Neto, presidente da Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína (Abipecs). Para ele, mesmo que o Japão comece a comprar carne suína ainda neste ano, não mudará a atual situação do setor produtivo no curto prazo. “Nada na Ásia é rápido. Vai demorar um pouco para que os ganhos da indústria cheguem aos produtores, já que a quantidade de carne ao Japão deve ser pequena no início”, diz. “Esse mercado não se formará da noite para o dia.” Para Camargo Neto, a principal razão da atual crise gaúcha e catarinense é o embargo russo às carnes brasileiras, que já completou um ano. “Os produtores apostaram na ampliação do mercado russo, que sempre pagou muito bem para a indústria, o que não acontece com outros mercados”, afirma. Por essa razão, o presidente da Abipecs acredita que é difícil comemorar o aumento de 5% nas exportações brasileiras de suínos, no acumulado entre janeiro e maio. Nesse período, foram exportadas 224,8 mil toneladas de carne, ante 214,1 mil toneladas no ano passado. A receita da indústria, porém, caiu 0,86%, sobre as vendas de US$ 583 milhões obtidas no mesmo período no ano passado. A maior parte dos embarques teve como destino a Ucrânia e Hong Kong.