Colapso:

operando no limite, os portos brasileiros apresentam o maior gargalo no escoamento dos produtos agrícolas

As filas intermináveis de caminhões transformam as vias de acesso ao terminal marítimo em um gigantesco estacionamento a céu aberto. São horas que se prolongam por dias de espera. A cena se repete em Santos (SP), Paranaguá (PR), Rio Grande (RS), Vitória (ES), Suape (PE), Itajaí e São Francisco do Sul (SC), além de outros dos 37 portos públicos brasileiros, responsáveis por 76,7% da movimentação de comércio exterior do País.

Do lado de dentro, o caos se repete. Terminais com instalações e equipamentos obsoletos aumentam a agonia de quem precisa dos portos para exportar ou importar. A pouca profundidade dos canais de acesso marítimo limita as operações das embarcações internacionais. “Na maioria dos terminais, os calados são de 20 anos atrás”, diz Elias Gedeon, diretor-executivo do Centro Nacional de Navegação (Centronave). Esses são alguns dos fatores que estão levando os portos brasileiros a um processo de estagnação que pode comprometer as exportações, em especial do agronegócio.

Com previsão de uma safra 16% maior do que a de 2010 e movimentação recorde de exportação de produtos agrícolas, a recuperação dos portos se tornou um dos problemas mais urgentes do País. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), são necessários 265 obras e investimentos de R$ 43 bilhões na construção, ampliação e recuperação de áreas portuárias em todo o País, incluindo projetos de acesso terrestre (rodoviário e ferroviário), modernização de equipamentos e dragagens.

 

 

Fila única:

a falta de infraestrutura nos portos atinge toda a logística de transporte. Acima, congestionamento rumo a Paranaguá (PR)

Historicamente, os investimentos no setor são muito baixos: nos últimos dez anos, o valor aplicado foi de R$ 8,8 bilhões, o que equivale a 0,06% do Produto Interno Bruto (PIB).

Um dos principais gargalos portuários são os atrasos nos embarques e desembarques. A morosidade se traduz em prejuízos. Segundo a Centronave, entre janeiro e setembro de 2010, nos 17 principais terminais de contêineres os atrasos totalizaram mais de 72.401 horas. A espera levou ao cancelamento de 741 embarques e desembarques previstos. “Esses cancelamentos explicam-se pelos problemas de congestionamento no porto de Santos, que geram um efeito dominó, prejudicando a operação nos demais portos”, diz Gedeon, da Centronave. As horas de espera no porto de Santos provocaram uma diminuição de escalas de 803 para 705 na comparação do período analisado entre 2009 e 2010. E os atrasos com embarque e desembarque também saltaram, de 12.348 para 17.054 horas.

Estimativas do mercado revelam que os atrasos no porto de Santos podem provocar um custo extra de US$ 95 milhões por ano, o que equivale a US$ 73 por contêiner cheio, ou 8% do frete. A situação crítica no mais movimentado porto do País tende a piorar este ano. Segundo Daniel Rocha, chefe do Serviço de Vigilância Agropecuária do Porto de Santos, em 2010 o terminal foi responsável pelo transporte de 96 milhões de toneladas de grãos e a expectativa para 2011 é que se chegue a 101 milhões de toneladas. Nos últimos dez anos o porto santista contabilizou um aumento de 215% no volume de contêineres, enquanto o comprimento acostável nos berços e atracações cresceu apenas 23% e a área de alfândega, 20%.

 

Matemática:

os números do setor portuário no Brasil

95% do comércio exterior brasileiro é marítimo

R$ 43 bilhões é a estimativa de investimentos na reestruturação

37 é o número de terminais públicos brasileiros

76,7% da movimentação de comércio exterior é pelos portos públicos

US$ 95 milhões por ano é o custo extra provocado pelos atrasos em Santos

96 milhões de toneladas de grão passaram por Santos em 2010

 

O efeito dominó provocado pelo congestionamento de Santos atinge principalmente os portos da região Sul. Em Paranaguá (PR) e Rio Grande (RS), uma em cada quatro escalas foi cancelada este ano. “Vamos ter muita fila de caminhão e navio em Paranaguá”, prevê Nilson Hanbke Camargo, assessor técnico-econômico da Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep). A perspectiva de safra recorde e o aumento de preço dos produtos também vão contribuir para o congestionamento. Gedeon, lista as sugestões para amenizar a situação: drenagens, licitação para a construção de novas áreas retroportuárias alfandegadas, aumento da capacidade de armazenagem, redução do tempo de permanência das mercadorias nos terminais, implantação de processos permitindo a liberação de carga antes da sua chegada e aumento de fiscais da Receita Federal. “São algumas das medidas que o governo pode tirar do papel”, diz ele.