A câmara dos deputados federal terá de votar em breve o Projeto de Lei 5851-2016, de autoria do Deputado Federal Valdir Colatto e que disciplina o aproveitamento de carcaças de animais de produção e resíduos animais no campo para fins não comestíveis.

É importante salientar que este PL visa facilitar o trabalho do produtor rural e não contempla as mortes causadas por doenças animais de notificação obrigatória. Por não considerar diversas questões importantes, a sua aprovação pode representar um grande risco a toda a cadeia produtiva de carnes, tanto do ponto de vista sanitário como econômico, colocando em xeque a reputação conquistada por essa indústria.

Em geral, o PL propõe normas de recolhimento, estocagem, transporte e processamento. No entanto, o primeiro ponto de atenção é o fato de não contemplar discussões levadas a termo pela Embrapa, o MAPA, os órgãos de Defesa Animal Estaduais, as Agroindústrias das Cadeias Produtivas de Suínos, Aves e Bovinos de Leite e de Corte bem como sindicatos, como o SINDIRAÇÕES, e entidades técnicas como o Colégio Brasileiro de Nutrição Animal.

Essas instituições vêm desde 2015 discutindo alternativas para a melhor destinação de carcaças de animais mortos nas propriedades rurais haja vista as ameaças à saúde humana e aos rebanhos.

Outro ponto sensível está no artigo 10 da proposta apresentada. O texto diz: “o processo de reciclagem deve gerar produtos não comestíveis, como sólidos proteináceos, gordura fundida e água, podendo sólidos e gorduras ser utilizados como ingredientes de ração para animais, adubos, biodiesel, saboarias, produtos de higiene e limpeza e indústria química, devendo a água seguir para o sistema de tratamento adequado segundo legislação vigente”.

O primeiro impacto negativo é que de acordo com as maiores empresas de produção de alimentos essa não seria uma possibilidade, pois implicaria em produzir algo que não seria consumido posteriormente.  Além disso, da maneira em que está proposto, o PL deixa de focar em tecnologias e formas de subsidiá-la, para que exista a devida destinação nas propriedades ou em centrais de tratamento, mas sim traz este material para o setor de rações, colocando em risco a saúde do consumidor e dos plantéis.

Outro agravante é a não conformidade com as normas de produção de bem estar animal respeitadas mundialmente. Não se pode assumir que um animal tenha seu bem estar respeitado recebendo alimento cuja qualidade esteja comprometida.

É possível projetar também o impacto negativo da PL no âmbito econômico. Embora tanto o consumidor interno quanto o externo devam ser respeitados e a eles devemos oferecer alimentos seguros, as exportações certamente sofreriam queda. É preciso levar em consideração que o Brasil não é o único país exportador de frangos e suínos no mundo, e neste mercado competitivo absolutamente tudo pode ser argumento para a perda dos negócios globais.

O Brasil ocupa posição de extrema relevância no que se refere à produção mundial de proteína de origem animal. A importância das cadeias produtivas de carne é fundamental para o PIB e a balança comercial do país. Todo esse resultado é fruto de um longo trabalho de desenvolvimento, modernização e intensificação destes setores. Desta forma, é primordial que o país continue sendo economicamente competitivo e que tenha pleno controle sobre aspectos sanitários.

Quaisquer riscos neste sentido são críticos para a nação. Por outro lado, aspectos ambientais também precisam ser considerados. Ocorre que à medida que as atividades aumentam a escala de produção, também crescem os desafios, sendo um destes a destinação de animais que morrem ao longo da cadeia produtiva, seja por causas naturais, acidentais ou sanitárias.

A apresentação de um Projeto de Lei que não contemple o esforço e os resultados científicos gerados em condições brasileiras põe em risco a saúde humana, a saúde dos rebanhos e a credibilidade das instituições oficiais brasileiras além de ameaçar conquistas no mercado de exportações, resultado de trabalho árduo e de décadas de desenvolvimento.

Desta forma, alertamos para o enorme risco de prejuízo à nação brasileira com a aprovação desse Projeto de Lei, nesse momento em que as primeiras informações científicas estão sendo geradas por meio da pesquisa TECDAM (tecnologias para destinação de animais mortos) fruto da parceria entre Embrapa Suínos e Aves e o MAPA para auxiliar à tomada de decisão das melhores rotas de destinação dos animais mortos dentro dos sistemas de produção.

Salienta-se a necessidade de análises de riscos, com vistas a resguardar a sustentabilidade e competitividade das cadeias produtivas.

O entendimento é de que o setor antes de propor uma medida com tantos riscos potenciais, deveria investir ou viabilizar formas alternativas à destinação da carcaça animal como: compostagem, especialmente para descarte de aves ou pequenos animais, incineração, reconhecida por sua eficiência, porém de custo elevado; biodigestão e produção de biocombustíveis. A viabilidade de cada alternativa dependerá de inovações incrementais que vierem a ser desenvolvidas pelos fabricantes de equipamentos que atuam neste mercado.