Rei da soja na Argentina fala sobre a expansão de sua empresa no continente e do modelo de negócios que pretende aplicar no Brasil

Ele não é dono de uma colheitadeira ou trator nem mesmo de um palmo de terra cultivada. Mas mesmo assim sua empresa produz 2,5 milhões de toneladas de grãos, em 250 mil hectares espalhados por Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e, logo mais, também pela Colômbia. Este é Gustavo Grobocopatel, dono do grupo Los Grobo, que ergueu um império por meio de arrendamentos de terras, fomento de empresas terceirizadas e baixos custos operacionais. Seus planos para o Brasil e para o continente você confere a seguir.

DINHEIRO RURAL – Como está formado o grupo no Brasil?

GUSTAVO GROBOCOPATEL – O grupo Los Grobo é associado à Pactual Captal Partner. Estamos construindo nosso futuro no Brasil em cima de dois negócios. A primeira foi a compra de uma pequena empresa maranhense chamada Ceagro. É uma empresa com uma história de sucesso em Balsas, com atuação em todo o Mapito (divisa entre Maranhão, Piauí e Tocantins). Estamos trabalhando juntos com os fundadores da companhia. A outra operação foi a compra dos sistemas de armazenagens da Selecta e todas as suas operações.

RURAL – Nesta última aquisição, o valor passou de US$ 25 milhões…

GROBOCOPATEL – Na verdade, fechamos negócio em US$ 30 milhões. Toda a parte de produção da Selecta passará também a se chamar Los Grobo e vamos trabalhar, preferencialmente, no Estado de Goiás e também no triângulo mineiro.

RURAL – E como se deu a participação do grupo Pactual nesta operação?

GROBOCOPATEL – O Pactual é parceiro do grupo Los Grobo não só nas operações brasileiras, mas em toda a região, incluindo Argentina, Paraguai e Uruguai, numa área total de 250 mil hectares, que produzem 2,5 milhões de toneladas de grãos. Eles possuem 25% do grupo Los Grobo, logo possuem uma participação muito importante.

RURAL – O sr. disse recentemente que os preços das commodities vão se recuperar em breve. Essa expectativa ainda é mantida?

GROBOCOPATEL – É uma questão muito difícil. O que podemos verificar é uma queda bastante acentuada na demanda, que reflete nos preços. Sobre a queda na demanda, atribuída à crise, há que se desvendar quanto tempo ela vai durar. Até porque não acredito que as pessoas vão deixar de comer. Então, assim que a demanda se recompuser, os preços devem acompanhar o movimento e subir. A demanda vai seguir, só que um pouco mais lenta…

RURAL – Como está o sentimento do produtor argentino em relação à crise?

GROBOCOPATEL – Assim como os brasileiros, nós argentinos temos plantado a um custo muito alto e encontrado um mercado com preços depreciados. Então, se existem os números, eles mostrarão uma rentabilidade mais baixa. Só que na Argentina a situação é mais grave devido aos problemas entre produtores e a presidente Cristina Kirschner, que implantou um sistema de impostos para exportações que impede uma maior renda para o agricultor.

RURAL – Mas, por outro lado, para os grandes grupos, uma crise pode ser o momento para crescer…

GROBOCOPATEL – Acredito que a crise esteja diretamente ligada à gestão financeira de cada empresa, independentemente do tamanho. Grandes produtores com boa gestão estarão mais protegidos, assim como os pequenos na mesma situação. O contrário também é verdade, ou seja, grandes grupos com problemas financeiros estarão com dificuldades também. As oportunidades estarão por aí e nós mesmos, se pudermos, vamos crescer.

RURAL – Quais seriam os fatores para que essas oportunidades virassem negócios?

GROBOCOPATEL- Acredito que, conforme os preços dos grãos se recuperarem, aumentam as chances de novos investimentos. Com os preços mais baixos, o momento será de mais cautela. No nosso caso, em específico, o Los Grobo não compra terras, trabalhando apenas num sistema de arrendamento. O que temos é fundo de terras, chamado Solos Captal, pelo qual compramos terras. Aliás, estamos comprando agora na região do Mapito.

RURAL – As novas regras para compra de terras no Brasil por estrangeiros não podem atrapalhar qualquer expansão pretendida?

GROBOCOPATEL – Veja bem… Nesta sociedade em que vivemos, o que importa não é a propriedade da terra e sim o conhecimento sobre o que fazer com ela. O conhecimento significa capacidade de gestão sobre essas terras e que tipo de serviços você pode prestar. Logo, os fatores clássicos da propriedade nem sempre são fundamentais para um trabalho. Neste caso, o mais importante é propriedade do conhecimento e a disponibilidade de terra para trabalharmos de um jeito ou de outro.

RURAL – Ainda assim, é curioso o fato de o grupo Los Grobo também não possuir maquinários próprios…

GROBOCOPATEL – Certamente, além de não termos terras próprias, também não temos maquinário. Só trabalhamos com empresas terceirizadas e incentivamos a criação dessas empresas. Isso tem dado muito resultado, principalmente por causa dos empregos e oportunidades criados.

RURAL – E como acontecem estes incentivos?

GROBOCOPATEL – Há, por exemplo, produtores que nos arrendam terras e se tornam também prestadores de serviço, o que fornece a essas pessoas um maior manejo de riscos. Se fosse apenas um produtor, neste momento, poderia estar perdendo dinheiro. Na verdade, estamos tentando integrar o melhor da nossa cultura, com o melhor da cultura brasileira e isso é muito bom. Criar uma nova cultura nesse sentido é, sem dúvida, algo que pode melhorar muito os nossos negócios.

RURAL – Mas nas fronteiras agrícolas ainda não há essas empresas formadas…

GROBOCOPATEL – O que estamos fazendo é desenvolver a estrutura de negócios como temos aqui na Argentina. A idéia é incentivar a criação de provedores de serviço, que formam redes de serviços. A relação, com isso, se torna muito mais profunda do que a que existe entre um simples prestador de serviços ou mesmo clientes. É uma relação de longo prazo e alto valor agregado. Temos relacionamentos muito antigos com esses parceiros, o que é muito bom, até porque eles crescem com a companhia.

RURAL – Na Argentina, o Los Grobo tem um modelo diferenciado de negócios. Como isso se dará no Brasil?

GROBOCOPATEL – É verdade. Nós não nos dedicamos apenas à produção, mas também somos prestadores de serviços no campo, e isso é uma coisa que vamos levar ao Brasil. Ao todo, temos aproximadamente cinco mil clientes e mais de quatro mil colaboradores que trabalham conosco. A idéia que temos junto com o Pactual é transferir este modelo para o Brasil, para ajudar no desenvolvimento agrícola do País.

RURAL – E isso aconteceria…

GROBOCOPATEL – Existem muitos aspectos desses serviços que se assemelham à estrutura de uma cooperativa. São serviços financeiros, logística, gestão de riscos, entre outros. A política da companhia é compartilhar conhecimento com nossos clientes e fornecedores. Apesar de os acionistas não serem os clientes, como no caso de uma cooperativa, o funcionamento e a colaboração são muito parecidos.

RURAL – Pode-se prever quando este modelo será implantado no Brasil?

GROBOCOPATEL – Este modelo está implantado na Ceagro, no Maranhão. Nos próximos dias ele chegará também à Selecta, em Goiás, que atenderá uma boa parte do triângulo mineiro.

RURAL – Mas serão necessários investimentos para fazer essa nova infra-estrutura funcionar…

GROBOCOPATEL – Tanto a Selecta quanto a Ceagro possuem uma infra-estrutura muito boa, que realmente atende às suas necessidades empresariais. Estamos falando que entre as duas companhias haverá uma capacidade para armazenar 500 mil toneladas de grãos e já temos os recursos para fazer tudo funcionar.

RURAL – Podemos apontar algumas diferenças no modo de operar?

GROBOCOPATEL – Estamos num processo de integração, que tem a ver com a transferência e a adaptação de nosso modelo de negócios da Argentina para o Brasil. Por exemplo, no caso das nossas duas empresas brasileiras, nosso modelo de negócios prevê uma integração entre serviços e produção. Nem a Ceagro nem a Selecta faziam produção própria e a partir deste ano começaram a fazer.

RURAL – Mas há diferenças importantes como nos custos de produção entre Brasil e Argentina…

GROBOCOPATEL – Sim, é muito diferente. Mas temos uma equipe totalmente brasileira. Só na Ceagro, no Maranhão, há uns 50 engenheiros agrônomos, todos brasileiros. Eles não só desenvolvem e controlam todo o plantio como também assessoram os clientes que fornecem para a Ceagro.

RURAL – Ainda assim, vocês possuem negócios no Paraguai e Uruguai. Por que esta estratégia de estar em diversos países e não a de concentrar os investimentos como faz a maioria das companhias?

GROBOCOPATEL – Los Grobo é uma empresa que está acostumada com este tipo de operação. Nos últimos anos construímos empresas, como você disse, no Uruguai, Paraguai, além da Argentina e Brasil. Temos todo um conhecimento e capacidade de integração corporativa, que é uma das claves de nossa filosofia de trabalho. À medida que crescemos e nos deparamos com os desafios da globalização, nos tornamos uma empresa cada vez mais regional e menos argentina, brasileira, paraguaia ou uruguaia. Somos uma empresa sul-americana.

RURAL – E esse “time” de países pode crescer?

GROBOCOPATEL – Com certeza. Neste momento, estamos realizando algumas consultas na Colômbia e temos planos de nos instalarmos por lá também. Concretamente, queremos desenvolver aquele mercado para a produção de soja e milho.

RURAL – A falta de crédito atinge a Los Grobo?

GROBOCOPATEL – Neste momento temos dinheiro em caixa. Estamos capitalizados, até pela injeção de capital realizada pelo banco Pactual. Também temos a colaboração de outras instituições financeiras e outros bancos. Podemos afirmar que temos o suficiente para levar adiante todos os projetos que iniciamos, inclusive os brasileiros.