06/06/2020 - 9:00
A pandemia trouxe de volta as tradicionais sacoleiras, que levavam as mercadorias até a casa do consumidor muito antes da era do e-commerce. Essa velha maneira de comercializar ganhou força nos últimos meses e está agora repaginada, numa espécie de “Rappi da moda”. Com a proibição da abertura de lojas físicas de itens não essenciais desde o fim de março na cidade de São Paulo, comércios de artigos de vestuário e pequenas confecções começaram a preparar “malinhas” com produtos para entregar no endereço do cliente.
Nessas malas de viagem, são colocadas blusas, vestidos, sapatos, entre outros itens de vestuário. Há até quem incremente a bagagem com máscaras, álcool em gel, chocolates e mensagens para que o cliente doe as roupas antigas, tudo num ambiente perfumado. Com o produto certo e esses agrados, a expectativa é de que o consumidor volte às compras e alivie um pouco o tombo registrado pelas lojas físicas. No mês passado, a queda de vendas no comércio tradicional da capital paulista beirou 70% comparado a maio de 2019, segundo a Associação Comercial de São Paulo.
“É a volta da sacoleira, como eu comecei vendendo roupas na época de faculdade”, relembra Ana Curan, sócia da Cia. Curan, loja multimarca de moda feminina. Há 23 anos instalada na Vila Madalena, zona oeste da capital, ela está com o ponto de venda fechado desde 19 de março. Para recuperar parte da receita, abriu um e-commerce e consultou as clientes para saber se queriam receber “sacolinhas” com produtos. “Todo mundo quis: as nossas clientes gostam mais da velha ‘sacolinha’ do que da loja online.”
Há mais de dois meses em casa, sem ver e ser visto, qual seria o motivo para alguém querer comprar uma roupa nova? Cássia Isbener, dona do ateliê de moda para tamanhos grandes que leva o seu nome, argumenta que muitas das clientes estão trabalhando em casa neste momento e têm de participar de conferências de vídeo. “Elas precisam estar bem arrumadas.” A microempresária já entregou 30 malinhas.
“As pessoas não estão comprando vestido de festa nem sapato de salto. São roupas confortáveis, é uma espécie de auto-agrado”, explica a empresária Eva Bichucher. Sócia da plataforma de eventos ItBrands, com a pandemia ela se viu impedida de continuar promovendo as feiras que fazia para apresentar marcas exclusivas de pequenos confeccionistas a um seleto grupo de consumidores.
A saída encontrada por Eva foi criar um evento alternativo. Reuniu produtos de 25 marcas, enviou fotos das coleções de moda para as clientes e, com ajuda de estilistas, fez malas com os itens escolhidos. As malas foram entregues nas casas de quem fez os pedidos. Batizado de “ItBrands at home”, o evento realizado na semana passada estava preparado para atender 200 clientes. Até quarta-feira, tinham sido enviadas 70 malas e, destas, em todas houve a aquisição de algum item.
Ao contrário da loja física, a venda em domicílio dá mais trabalho e traz menos resultados para o comerciante. Ele tem de conhecer o gosto do cliente, fazer a seleção de peças adequadas e entregar a mercadoria. Tudo sem a garantia de compra.
Para as consumidoras, manter a autoestima, ser solidária em relação à sobrevivência de pequenos negócios, a atração dos descontos e só ter vontade de comprar são alguns dos motivos apontados por quem foi às compras.
Em dois meses e meio de isolamento social, a bancária Caroline Rocha, de 28 anos, já recebeu três “malinhas” e nunca tinha adquirido produtos desta forma. “Comprei bastante.” Entre saias, vestidos e calças, ficou com nove peças de roupa nova. Trabalhando em home office, Caroline diz que o motivo da compra é autoestima. “Apesar de não estar saindo, gosto de estar bem arrumada em casa.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.