01/06/2012 - 0:00
Jay Wallace, da Ceplac
No auge da cultura do cacau, em 1980, a Bahia produzia 300 mil toneladas, 75% da safra do País
A produção de cacau, que já trouxe muito dinheiro aos agricultores brasileiros até a década de 1980 e era considerada o ouro das lavouras baianas, hoje é sinônimo de perdas bilionárias no País. O alto endividamento, a falta de novos créditos rurais, a baixa aplicação de tecnologias e a praga da vassoura de bruxa – uma doença ainda sem cura do cacaueiro – já levavam muitos produtores à bancarrota. “Na Bahia, já houve gente que trocou a fazenda por um barraco no morro”, diz José Carlos Soares de Assis, dono da fazenda Floresta, no município de Uruçuca, a 420 quilômetros de Salvador. “Isso não está longe de acontecer com todos.” O desespero de Assis tem razão de ser. Hoje, sua dívida com o Banco do Brasil é de R$ 4 milhões e ele está impossibilitado de tomar mais crédito para financiar a safra. “Antes eu tinha cheque dourado e tudo mais”, diz. “Hoje o banco me concede, no máximo, uma conta poupança. Mas, financiamento, nem pensar.” Na fazenda de 160 hectares, a atual produção de Assis é de 300 quilos por hectare, menos da metade da média de duas décadas atrás.
O caso de Assis não é isolado. Segundo Guilherme Galvão, presidente da Associação dos Produtores de Cacau (APC), com sede em Ilhéus, no litoral da Bahia, em função da queda de produção, a dívida dos cacauicultores da Bahia chega a R$ 1 bilhão. No final de abril, uma audiência pública, em Brasília, da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) reuniu produtores, indústria e o Ministério da Agricultura (Mapa). “Há dois anos vínhamos tentando fazer uma reunião para discutir que medidas tomar em relação ao crédito destinado ao setor”, diz Galvão. “O alto endividamento dos produtores, definitivamente, inviabiliza novos investimentos.” Para Galvão, o governo precisa tomar duas medidas. A primeira é estender o prazo de quitação de financiamento da safra de dois para oito anos, tempo necessário para uma lavoura recém-semeada atingir a plena produção de amêndoas de cacau. Na renegociação das dívidas, os bancos precisam estudar cada caso e reprogramar o seu pagamento a partir da produção. “Desde o mês passado, estamos aguardando uma nova audiência”, diz Galvão. “Espero que não demore dois anos.” O cacau já foi a principal atividade econômica da Bahia. No auge da cultura, a produção chegou a mais de 300 mil toneladas por ano, equivalente a 75% da safra brasileira. Mas, com a chegada da vassoura de bruxa, os agricultores que iam perdendo suas lavouras começaram a aumentar os pedidos de financiamento no banco, na tentativa de salvar o negócio. “Quase todos gastaram tudo o que tinham e o que não tinham com a esperança de recuperar os pomares”, diz Jay Wallace da Silva Mota, diretor da Comissão Executiva de Planejamento da Lavoura Cacaueira (Ceplac), órgão ligado ao Ministério da Agricultura.
Atualmente, o cacau é cultivado em seis Estados: Bahia, Pará, Rondônia, Espírito Santo, Mato Grosso e Amazonas. Apesar da crise, os baianos ainda são os maiores produtores do País, com 130 mil toneladas por ano, 62% do total nacional. Para Walter Tegani, presidente da Associação das Indústrias Processadoras de Cacau (AIPC), o País precisa voltar a crescer nesse setor. “Enquanto a produção da matéria-prima caiu, o consumo nacional de chocolate cresceu”, diz Tegani. “Hoje, cada brasileiro consome 1,3 quilo por ano, quatro vezes mais do que há dez anos.” Por causa do consumo aquecido, no ano passado a indústria importou 9,7 mil toneladas por US$ 38,5 milhões. “Neste ano a importação deve crescer acima de 10%”, diz Tegani. De janeiro a abril, a indústria de chocolate importou seis mil toneladas de cacau em pó, ante 3,3 mil toneladas no mesmo período do ano passado.
EM BAIXA
Entenda a situação da cacauicultura no Brasil
Área plantada atual:
700 hectares
Área plantada nos anos 1980: 500 hectares
Produção atual:
210 mil toneladas
Produção nos anos 1980:
400 mil toneladas
Capacidade de processamento
da indústria: 240 mil toneladas
Importação:
9,7 mil toneladas
Dívida do setor:
R$ 1 bilhão na Bahia