Secretário de Agricultura paulista defende setor do álcool, mas também a diversificação do maior pólo agrícola do País

João de Almeida Sampaio Filho tem o agronegócio no sangue. Economista e produtor rural, é conselheiro da Associação Brasileira do Agronegócio de Ribeirão Preto, já esteve à frente da Associação dos Produtores de Borracha de Mato Grosso, dirigiu a Câmara Setorial Nacional da Borracha e ocupou a presidência da Sociedade Rural Brasileira. Hoje, como secretário do governo de São Paulo, quer fazer a pesquisa chegar ao campo e, embora exalte a força do setor canavieiro, diz que lutará para manter a diversificação do agronegócio paulista.

Dinheiro Rural – Quais são hoje os principais desafios do agronegócio paulista?

João de Almeida Sampaio Filho – O principal desafio é manter a diversificação. São Paulo é o maior Estado agrícola do Brasil, chegou a ter quase o dobro do segundo colocado. Tem 20% do total do valor da produção agropecuária brasileira. O segundo colocado tem 11%. Por que tem isso? Por causa da diversificação. São Paulo é o maior Estado para cana-de-açúcar, laranja, frutas, grande produtor na pecuária, no café, na borracha, produtos de valor agregado que fazem com que a renda agrícola seja diversificada e grande perante o restante do Brasil. O desafio é manter esta diversificação. Cana é importante, muito. Mas não podemos deixar que ela sufoque a pecuária, a cafeicultura ou a citricultura. O maior desafio, dentro da porteira, é manter a diversificação. Depois, é fazer a pesquisa chegar ao campo. O terceiro desafio do agronegócio paulista é agregar valor. São Paulo, mais que os outros Estados agrícolas brasileiros, já tem uma agregação de valor maior, por logística, por ter mercado. Mas pode e deve fazer mais, ser mais ambicioso.

RURAL – Como o sr. avalia 2007 e qual é a projeção para 2008?

Sampaio Filho – 2007 foi um ano de recuperação para a maior parte dos agricultores. Quem perdeu renda foi o produtor de cana. Acredito que para 2008 o cenário é positivo, vai ser um ano melhor do que os dois últimos anos. Sem dúvida, o problema de grãos melhorou. Embora tenhamos problemas sérios de endividamento em Mato Grosso. Aqui, em São Paulo, vamos ter um ano pior para a cana, mas nas outras atividades vamos ter um ano melhor. Acredito na volta das exportações de São Paulo para países importantes. Melhora a questão da pecuária, da pecuária de leite, da ovinocultura, grãos de maneira geral. Na citricultura, estamos trabalhando para ter um acordo de convivência, que gere um equilíbrio na cadeia produtiva.

“Até o fim do ano, Serra quer o projeto de um alcoolduto em parceria com o setor privado”

RURAL – O sr. fala em diversificação. Mas o avanço da cana não é a contramão disso?

Sampaio Filho – Aparentemente sim. Na prática, não. São Paulo tem 22 milhões de hectares aproveitáveis. A cana ocupa algo como 4,8 milhões, a pecuária 9,5 milhões, reflorestamento mais de um milhão de hectares, citricultura, 400 mil hectares, a cafeicultura e fruticultura também. Nos dois últimos anos, houve euforia com a cana por conta dos preços em alta do açúcar no mercado internacional e de um consumo interno de etanol crescente por causa dos carros flex. A pecuária vivia um momento péssimo, os grãos um momento desastroso, a citricultura com baixa rentabilidade. Então houve a migração para a cana. Em algumas regiões, a cana cresceu mais de 20% de um ano para o outro. Mas a pecuária diminuiu 20%? Não. Ela tinha 12,6 milhões de animais e foi para 12 milhões. Diminuiu 5%. A citricultura perdeu área? Não, cresceu 5% e migrou do Centro- Norte para o Centro-Sul. O café manteve a área. Seringueira e fruticultura cresceram. Então, o que aconteceu? Tecnificou e teve verticalização da atividade. A pecuária começou a ter mais confinamento à base de cana. O que vem pela frente? Este ano foi ruim para a cana, 2008 provavelmente vai ser novamente. Em contrapartida, a pecuária melhorou e as perspectivas são boas para 2008. Nos grãos também. Imaginou-se que a cana iria dominar e virar monocultura, mas estamos atentos para que não ocorra. Estamos revendo o zoneamento agrícola da cana.

RURAL – Este avanço da cana não é um risco? Não há garantias de que o mercado absorverá todo este etanol…

Sampaio Filho – É um risco. Se um produtor me perguntar hoje: “Eu vou para a cana?”, a minha resposta é: integralmente não. Se você é um citricultor, não acabe com o seu pomar para ir para a cana, que está num momento excepcional, porque a curva vai reverter nos dois casos. Meu conselho é: diversifique, tenha uma, duas, três atividades. Uma coisa está ruim, outra está boa.

RURAL – Como se pode fazer esta transferência de tecnologia?

Sampaio Filho – A Secretaria da Agricultura e seus órgãos devem interagir de maneira eficiente entre si e com os produtores agrícolas. A secretaria tem seis institutos de pesquisa: o Agronômico, que é o mais antigo, o de Zootecnia, o Biológico, de Economia Agrícola, de Tecnologia de Alimentos e da Pesca. Então é fazer com que as pesquisas desenvolvidas por estes seis institutos possam ser aplicadas, através da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati), que leva isto para o campo.

RURAL – São Paulo é conhecido com um Estado industrial. Qual é o peso do agronegócio na balança comercial paulista?

Sampaio Filho – O agronegócio paulista representa em torno de 30% do Estado de São Paulo. E na balança comercial, o superávit que o Estado tem, fundamentalmente, é do agronegócio. As exportações do campo atingiram US$ 14,74 bilhões em 2006, enquanto as importações somaram US$ 4,59 bilhões. No geral, as importações paulistas foram de US$ 32,48 bilhões contra US$ 31,19 bilhões das exportações, o que gerou um déficit de US$ 1,29 bilhão. Dessa forma, o superávit do comércio exterior paulista continua dependendo do agronegócio.

RURAL – O que é pior: câmbio ou juros?

Sampaio Filho – Tem uma história que o Mario Simonsen disse uma vez: “O juro aleija e o câmbio mata.” O juro é muito ruim, mas o câmbio devargarzinho vai minando o negócio até acabar. Tem também aquela fábula, em que você pega um sapo, coloca na água fria e vai aquecendo a água devagar. Quando está quente, ele não dá conta de sair e morre. Já se você pega o sapo e joga na água fervendo, ele pula na hora. O câmbio faz isso com o agricultor, ele vai perdendo renda e quando percebe já é tarde. Acho que o câmbio é pior. O Brasil deveria trabalhar a questão cambial de maneira diferente, porque este câmbio livre pode gerar problemas para a agricultura.

RURAL – Ao mesmo tempo que o campo reclama pela questão cambial, as exportações estão crescendo em volume…

Sampaio Filho – Não adianta ser o maior exportador, se não tiver renda. É preciso que o agricultor tenha renda, pois isso fomenta a economia em sua região.

“O Porto de Santos precisa de uma gestão focada e o governador Serra deixou isso claro”

RURAL – Sobre a questão climática, esta seca não vai prejudicar a próxima safra?

Sampaio Filho – Para a cana, ela melhora o teor de sacarose. Pode ter melhorado a vida de alguns usineiros. Para o ano que vem é ruim, vai produzir menos. O café pegou seca no auge da florada, o que vai gerar um café desigual, de bebida ruim. A laranja está na colheita e os frutos estão murchos, a folha enrolada. As frutas, de uma maneira geral, tiveram prejuízos. A seringueira não produziu.

RURAL – E o que faz o Estado?

Sampaio Filho – Nós não temos políticas específicas para seca. Temos o programa de seguros, principalmente para fruticultura, que subsidia parte do prêmio do produtor para o seguro da safra.

RURAL – O sr. falou de seguro, quais os subsídios que São Paulo dá a seus agricultores?

Sampaio Filho – Só o seguro, e metade do prêmio. Mas quando ele contrata o seguro hoje, tem a opção de que metade do prêmio seja pago pelo governo federal. Da outra metade, nós pagamos metade. Depois temos dentro do Fundo de Expansão para o Agronegócio Paulista (Feap) uma linha voltada ao médio produtor, aquele com renda bruta anual de R$ 400 mil, que é a classe média rural, a maior parte dos produtores paulistas. Qual o juro disso? São 3% fixos ao ano, que é o menor juro de mercado para o produtor neste porte. Financiamos máquinas e implementos com valores limitados. Foi um sucesso tão grande que este ano o financiamento abriu numa quinta-feira às 9 horas da manhã e terminou na sexta-feira às 4 horas da tarde. Neste tempo, os R$ 6,5 milhões se foram.

RURAL – Quais as fronteiras do agronegócio paulista?

Sampaio Filho – A principal é a tecnológica, mas temos a fronteira do oeste paulista, no Pontal do Paranapanema. Estamos com obras de infra-estrutura: recuperação de vicinais, perenização de estradas rurais, escolas, regularização fundiária. O Vale do Ribeira é a região mais pobre do Estado, mas rica em diversidade ambiental, ecológica. É uma fronteira com nicho específico de mercado, os produtos sustentáveis. No Vale do Paraíba, queremos a recuperação da pecuária leiteira e, na região central e norte do Estado, a mais desenvolvida, teremos nichos na produção de carne e na avicultura. São Paulo é um grande exportador de genética bovina, suína e de aves, o maior produtor de ovos do Brasil. Na cana, a grande fronteira não é o açúcar e nem tampouco o etanol: é a alcoolquímica. Então, chegamos na questão tecnológica. Nossos institutos buscam isso, o produto diferenciado, da tecnociência, da nanotecnologia. Acredito nos transgênicos. Há espaço para tudo: ambientalmente correto, natural, assim como acho que há espaço para o transgênico, que vai ganhar produtividade. São Paulo tem que verticalizar, não horizontalizar. Nós temos 9 milhões de hectares para pecuária e 12 milhões de cabeças. Provavelmente vai crescer o confinamento, a integração lavoura- pecuária.

RURAL – E a questão logística? O Porto de Santos não está sobrecarregado?

Sampaio Filho – A primeira solução: o Porto de Santos precisa de uma gestão focada e o governador José Serra deixou isso bem claro desde o começo. A gestão do porto de Santos deveria ser estadualizada. Infelizmente, está difícil. Mas o porto precisaria de melhorias, de acesso, dragagem, infra-estrutura. O terminal de São Sebastião é uma opção e o governo tem investido. Existe uma perspectiva de que seja feito um porto privado em Peruíbe, mas a gente vai ter que trabalhar, neste momento, com o de São Sebastião.

RURAL – O que mais tem para ser feito na infra-estrutura?

Sampaio Filho – Estamos trabalhando, estudando e até o final deste ano o governador Serra quer pronto o projeto do alcoolduto, que seria um projeto, uma parceria entre o governo e o setor privado para escoar o etanol até o Porto de Santos ou São Sebastião. O estudo vai dizer qual é a melhor modelagem e qual é a melhor saída. O programa de vicinais, de estradas e mesmo o programa da secretaria são enormes. Aqui, temos o Melhor Caminho, programa que completou 10 anos este ano. Fez 5 mil quilômetros em 10 anos. Só este ano, vamos fazer 800 quilômetros e a meta do governador é fazer 2 mil quilômetros por ano, nos próximos três anos. Ambiciosa, mas factível.