No ano passado, tive a oportunidade de visitar campos de produção de arroz nas montanhas do norte do Vietnam, na companhia de uma guia local, a senhora Bee. Trata-se de uma região de beleza indescritível, mas extremamente pobre. Apesar da simplicidade — sua casa tinha piso de terra batida — a senhora Bee checava emails em seu celular de última geração, enquanto caminhávamos pelos arrozais. Durante o tempo que passamos juntos, além de me brindar com informações sobre técnicas produtivas, ela debateu comigo sobre o conflito  petrolífero entre Vietnam e China, e sobre possíveis candidatos a presidente nas próximas eleições dos Estados Unidos. Ela também estava informada sobre novos insumos para a produção agrícola e se aproveitava do potencial turístico da área para receber visitantes estrangeiros. O mundo se conectava àquela inóspita região através da tela do celular da senhora Bee, e vice-versa.

Deste lado do mundo, basta tomar um trem urbano em São Paulo ou no Rio de Janeiro para observar que muitas pessoas estão conectadas por seus smartphones, independentemente da classe social. Reduzimos de forma drástica a exclusão digital nos grandes centros. No Brasil, é inegável que a distância entre as classes mais ricas e mais pobres, apesar de ainda ser enorme, do ponto de vista financeiro, reduziu-se enormemente no que tange ao acesso à informação. Investimentos em educação ainda são essenciais, mas, pelo menos nos dias atuais, há outras formas para se manter informado. Seja através de notícias, cursos online e até mesmo das redes sociais, é inegável que o abismo está diminuindo e trazendo enormes benefícios para a sociedade.

De fato, segundo um relatório do Banco Mundial, o uso de comunicação móvel oferece grandes oportunidades. Hoje, três quartos da população global já possuem acesso a um celular, trazendo consigo diversas possibilidades de desenvolvimento socioeconômico, acesso básico à educação e até um maior envolvimento cívico e promoção da democracia. O relatório também discorre sobre os efeitos multiplicadores da tecnologia, estimulando o crescimento econômico, os ganhos de produtividade e o empreendedorismo. De acordo com o estudo, um avanço de 10% dos celulares levaria a um crescimento econômico anual de 0,6% a 0,8%.
No entanto, apesar dos ganhos indiscutíveis nos centros urbanos, a cobertura móvel digital no Brasil é mais um dos nossos desafios de infraestrutura. Se é verdade que muitas cidades ainda sofrem com a qualidade do sinal, é fácil imaginar a situação em regiões mais afastadas. A boa notícias é que os  governos estão preocupados com  esse quadro. Os últimos editais de comunicação móvel, por exemplo, incluíram a obrigação para as empresas vencedoras de levarem acesso às cidades menores. Porém, em um País de dimensões continentais como o Brasil, esse desafio não é fácil.


Inclusão digital: como na China, as tecnologias de comunicação podem promover o desenvolvimento dos agricultores em várias partes do mundo

O fato é que a exclusão digital no Brasil não se caracteriza mais por uma divisão de classe social, mas sim pela localização geográfica. Há cobertura móvel nos grandes centros e falta dela no campo. Trata-se de uma nova dicotomia urbano-rural, que pode trazer consequências para o País que queremos e afetar a produção dos alimentos de que necessitamos.

Outro relatório do Banco Mundial fez uma compilação de estudos sobre a penetração da comunicação e seu impacto na economia agrícola. Foi estimado que, em alguns casos, a renda de produtores chegou a crescer até 35% apenas pelo uso das tecnologias de comunicação. Alguns fatores que explicam esses ganhos vão desde o aumento do poder de barganha e o acesso a melhores preços, até mudanças comportamentais.  Há outros estudos sendo desenvolvidos sobre os potenciais impactos na produtividade. A internet pode nos auxiliar a fazer mais, com menos na agricultura? Informação é poder e nenhum outro meio é tão eficiente nisso como a comunicação móvel.

É indiscutível que o Brasil avançou, diminuindo o problema da exclusão digital nos grandes centros. Os resultados socioeconômicos já são perceptíveis. Mas, outro abismo se abre entre as áreas urbanas e rurais, sendo a implementação da infraestrutura o principal desafio, algo imprescindível para integrar os produtores à nova sociedade da informação. Para o futuro desenvolvimento do Brasil, a inclusão digital no campo tem de estar na agenda pública.