04/03/2021 - 18:54
O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria nesta quinta, 4, para validar a abrangência nacional de decisões tomadas em ações civis públicas, declarando inconstitucional a limitação do alcance destes processos. O julgamento, porém, foi interrompido após o pedido de vista (mais tempo de análise) do ministro Gilmar Mendes. A decisão do tribunal é de repercussão geral e cria precedente que deverá ser seguido por juízes de todo o País.
Até o momento, seis ministros votaram para derrubar o artigo da Lei das Ações Civis Públicas (Lei 7.347/1985) que previa que o alcance das decisões nestes processos valem ‘nos limites da competência territorial do órgão prolator’. Para o STF, tal dispositivo é inconstitucional e a abrangência das decisões deve ser nacional.
Em março do ano passado, o ministro Alexandre de Moraes suspendeu todos os processos que discutiam a abrangência territorial até o Supremo formar um entendimento geral sobre o assunto. Na sessão desta quinta, o ministro considerou que a limitação territorial ‘fere de morte’ os princípios da igualdade, eficiência, segurança jurídica e efetiva tutela jurisdicional.
“A finalidade [do artigo] foi ostensivamente restringir os efeitos condenatórios de demandas coletivas, foi ostensivamente limitar o rol dos beneficiários da decisão, por meio de um critério territorial de competência que não se coaduna, a meu ver, com a própria finalidade constitucional de proteção aos interesses difusos e coletivos. O que se pretendeu foi fracionar a defesa dos interesses difusos e coletivos por células territoriais”, disse.
Em seu voto, Moraes defendeu que o artigo é incompatível com a própria finalidade da ação civil pública.
“Há todo um caminho histórico, em virtude de necessidades sociais e a finalidade social protetiva, e há todo um caminho de construção legislativa, jurídica e jurisprudencial sempre no sentido de garantir mais efetividade a esse microssistema processual de proteção a interesses coletivos”, defendeu. “A alteração realizada no artigo 16 da Lei da Ação Civil Pública veio na contramão desse avanço institucional”, completou.
Na avaliação do ministro, o critério territorial vale para definir o juízo competente para processar as ações, mas não para limitar efeitos das decisões. A tese defendida por Moraes e acompanhada pelos demais ministros fixa ainda que, em casos de múltiplas ações civis públicas sobre o mesmo assunto, o juiz competente para julgá-las será o primeiro magistrado que conheceu de uma delas para julgamento.
O relator foi acompanhado pelos colegas Nunes Marques, Cármen Lúcia, Edson Fachin, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski, que pontuou que o acesso à Justiça, principalmente para pessoas hipossuficientes, deve passar pelo fortalecimento das ações coletivas.
O caso concreto em discussão no Supremo discutiu um recurso movido pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) contra entidades bancárias.
A ação civil pública (ACP) busca reparação e responsabilização de danos e direitos difusos e coletivos, como infrações ao meio ambiente, à honra a grupos raciais, étnicos e religiosos e ao consumidor, por exemplo. Tais processos podem ser natureza moral ou material, como ocorreu com as ações movidas relativas ao rompimento das barragens em Mariana (MG) e Brumadinho (MG), em 2015 e 2019.
A ACP pode ser movida pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública, pela União, Estados e municípios, por fundações e sociedades de economia mista ou por associações que tenham como finalidade a proteção de direitos coletivos. As medidas podem ser tomadas contra órgãos públicos, empresas e autoridades.
Já os cidadãos que queiram promover sozinhos uma medida do tipo devem se valer da Ação Popular, quando julgar que o poder público infringiu o patrimônio coletivo.
Hoje, há mais de 438 mil ações coletivas registradas no Cadastro Nacional de Ações Coletivas (Cacol), do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A decisão do Supremo pode levar à redução deste número, visto que não haveria a necessidade de análise de ações individuais, agilizando o processo.