O Mato Grosso é disparado o maior produtor de grãos do Brasil. Somente na última safra, o Estado, que abriga grandes grupos do agronegócio como Amaggi, Bom Jesus, Vanguarda, Bom Futuro, entre outros, colheu 26,4 milhões de toneladas de soja, o equivalente a 30,6% da produção total brasileira de 86,1 milhões de toneladas, segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Embora expressivos, os números camuflam um grande problema que o Estado tem enfrentado nos últimos anos, que é a estagnação de produtividade da oleaginosa. Dados da Fundação de Apoio à
Pesquisa Agropecuária de Mato Grosso (Fundação MT), revelam que há 14 anos o indicador está estacionado em 51 sacas de 60 quilos por hectare. Mesmo mantendo ainda a maior média nacional de produtividade do grão, por conta dessa defasagem, os agricultores mato-grossenses deixaram de ganhar R$ 723 milhões a cada safra, nos últimos 14 anos. Desde 2001,  período estudado pela Fundação, são nada menos que R$ 10 bilhões. 

De acordo com os especialistas, a principal responsável pela estagnação dos índices de produtividade é a falta de rotação das culturas, ou a combinação anual praticada apenas entre grãos. “O produtor
acredita que plantar soja na safra e milho na safrinha é rotação, quando na verdade está fazendo sucessão”, disse Francisco José Soares Neto, diretor da Fundação, durante um dia de campo, realizado
no Centro de Aprendizagem e Difusão (CAD), em Nova Mutum, nos dias 23 e 24 de janeiro. O evento reuniu mais de 700 participantes entre produtores, técnicos e especialistas. 

Para tentar reverter essa situação, os especialistas indicam o plantio de algumas culturas como solução para dar um “refresco” ao solo. O cultivo de forrageiras como braquiária, ou de leguminosas como a
crotalária, por exemplo, é uma alternativa eficaz para preservar a biodiversidade do solo. “Essas são duas opções interessantes, para tentar reverter o atraso de produtividade”, diz o engenheiro agrônomo
Leandro Zancanaro, pesquisador de projetos agrícolas da Fundação MT. Para ele, o fato de Mato Grosso ser o principal produtor brasileiro de soja, acaba mascarando prejuízos por conta do modo de cultivo. “O agricultor não sabe o quanto tem deixado de ganhar mais, por não olhar com atenção para o solo e a rotação de cultura”, afirma Zancanaro. Fazendo uma conta rápida, verifica-se que o sojicultor tem perdido nos últimos anos a média de 14 sacas de 60 quilos por hectare. Considerando- se que a saca de soja tem sido vendida, por R$ 60, cada produtor deixou de ganhar cerca de R$ 840 por hectare. “O agricultor não faz esta conta”, afirma o Zancanaro. “Ele acha que está tendo lucro, quando, na verdade, está perdendo”.  

Os 8,6 milhões de hectares plantados em Mato Grosso, renderam no ano passado R$ 24,6 bilhões, com a soja, responsável por 50% do Valor Bruto da Produção (VBP) do Estado. Caso os níveis de produtividade batessem na casa de 65 sacas por hectare, esse valor poderia subir para R$ 25,3 bilhões. “A agricultura ainda peca por ser um setor tradicionalista”, diz Zancanaro. “Estamos diante de um
cenário nada animador, e caso não seja feito algo, só vai se agravar”.

Além da estagnação em produtividade, devido à falta de rodízio adequado das culturas, o Mato Grosso tem presenciado o aumento de pragas na lavoura. Segundo o pesquisador da Fundação MT, atualmente, a cada quatro propriedades mato-grossenses, três já enfrentam problemas com nematóides. Que são parasitas que causam doenças na soja, como: ferrugem, mancha- alvo e antracnose. O problema tem se agravado ainda mais, justamente porque muitos produtores estão praticando apenas a monocultura, plantando a oleaginosa também na safrinha. “A monocultura deixa as pragas cada vez mais resistentes”, diz o Zancanaro. “Sem a biodiversidade do solo, não conseguiremos aumentar a produtividade das lavouras”. 

De acordo com Neto, o produtor não é o único responsável pelos problemas. O sistema logístico brasileiro é outro limitante para a rotação, já que todas as estruturas de armazenamento e transporte estão montadas somente para os grãos. “A questão logística está fora das mãos dos agricultores”, diz. O sistema atual brasileiro de produção, também é a principal queixa do gaúcho César Martins, dono da fazenda Sinuelo, que há 18 anos fincou raízes em Nova Mutum. O produtor, que cultiva 450 hectares de grão por safra, afirma que a logística brasileira e a mato-grossense não dão margens para o cultivo de outras culturas, como o girassol, por exemplo. “Hoje, não temos de fato alternativas”, diz. “Eu planto soja e milho, mas também tenho consciência da importância da rotação”, diz o produtor. Uma das poucas exceções entre seus pares, Martins também faz rodízio de cultura com a crotalária. O produtor utiliza a leguminosa para recuperar a produtividade de determinadas áreas de sua propriedade quando observa a baixa de fertilidade do solo e o aumento de pragas ou doenças. “Quando utilizamos a crotalária, quebramos o ciclo das pragas, recuperando a produtividade da área e do solo afetado”, diz. 

Ainda segundo Martins, falta maior dedicação por parte dos órgãos de extensão rural, para mostrar aos produtores, exemplos eficientes e rentáveis do sistema de rotação. “Ouvimos muita teoria, mas na prática não há nada de concreto”, diz. Para sanar essa lacuna, A Fundação MT esta criando um projeto, que consiste em estudar, identificar e pontuar os impactos do clima na soja e assim medir essas interferências na produtividade. Serão feitas parcerias para espalhar algumas estações meteorológicas de alta tecnologia, informatizadas, que vão medir tudo que acontece em determinadas áreas.
Assim serão cruzados os dados, observando o aparecimento de doenças e pragas. “Conseguiremos aferir qual é o verdadeiro impacto do clima na produção da soja e qual é a incidência de pragas e
doenças”, afirma o diretor da Fundação MT.