09/04/2018 - 10:00
Já imaginou passar horas observando cloacas de pintinhos recém-nascidos? Ou ficar parado ao lado de um touro, esperando pelo seu sêmen? Que tal então contar lagartas nas lavouras de soja, milho e algodão? Ou provar todos os dias 40 xícaras de cafés puros? Acredite, essas profissões inusitadas existem e são essenciais para o agronegócio. E elas são as únicas ocupações que pessoas não familiarizadas com o setor nunca ouviram falar. Retirar com pinça, como se fosse um ourives, cálculos biliares das vísceras de um bovino é trabalho de mestre dentro de um frigorífico. Existe, também, quiropraxistas de cavalos, polinizadores de florestas e, mais recentemente, pilotos de veículos aéreos não tripulados, os chamados drones.
Observe a história do paulista Luís Fernando Noda, de 41 anos, de Araçatuba (SP). Ele faz parte de uma equipe de 32 sexadores de aves que prestam serviços à Cobb, cujo trabalho é identificar o sexo de pintinhos com apenas um dia de vida. “Chego a separar, em média, sete mil pintinhos por dia”, diz Noda. “No início parece complicado, mas é fácil se acostumar com a tarefa.” O trabalho minucioso e delicado de Noda é feito em uma sala pouco iluminada, onde cada sexador separa lotes de 100 animais por vez. É com a luz e o tato que ele consegue distinguir machos e fêmeas. Para Álvaro Burin, diretor de produção da Cobb Vantress para a América do Sul, empresa de pesquisa genética avícola, controlada pela gigante americana Tyson Foods, separar por sexo os pintinhos de um dia é de extrema importância porque facilita o cruzamento de aves. “Precisamos da proporção certa entre machos e fêmeas para fazer os acasalamentos”, diz Burin. Mas não pense que é fácil ser um sexador. Para chegar lá, é preciso passar por treinamento de até dois anos na Associação Brasileira de Sexadores de Aves de Um Dia. “Os sexadores são profissionais que necessitam de muita concentração e especialização”, afirma o veterinário Jairo Arenazio, diretor-executivo da Cobb Vantress para a América do Sul.
O paulista Otávio Camargo Detling, de 43 anos, teve uma profissão que a maioria dos mortais jamais imaginou que poderia existir. Ele já foi coletor de sêmen bovino, por quase dois anos, na central de inseminação CRV Lagoa, em Sertãozinho (SP), subsidiária da cooperativa belgo-holandesa CRV. Hoje, ele é o responsável técnico pelos animais de alta performance da central. “Fiz um curso de técnico agrícola, mas foi no manejo dos animais que aprendi a função”, afirma Detling. “É preciso ter muito cuidado e saber respeitar os animais.” Coletar sêmen, acredite, é trabalho de equipe. Enquanto um auxiliar cuida de uma fêmea no cio, outro maneja o touro para a monta. É nessa hora que o coletor entra em cena, com uma espécie de camisinha para guardar o material genético. O Brasil, segundo maior mercado mundial de sêmen, produz por ano 12 milhões de doses. Na CRV Lagoa são coletadas 2,4 milhões de doses anualmente.
Os salários dessas profissões são bastante elásticos e podem ser equiparados às funções de nível técnico. A remuneração média de um sexador de aves, por exemplo, pode chegar a R$ 5 mil mensais. Um coletor de sêmen tem salário médio de R$ 2 mil. Mas há ocupações que pagam salários bem mais polpudos. Um coletor de bílis bovina pode ganhar até R$ 8 mil por mês.
Provadores e classificadores de café têm remuneração que podem atingir até R$ 10 mil. O administrador Lucas Pimenta Gonçalves, 37 anos, é um especialista em misturas, ou blends, de cafés para exportação. Há 19 anos, ele faz parte da equipe da Cooperativa Regional de Cafeicultores de Guaxupé (Cooxupé), do município de Guaxupé (MG), a maior cooperativa de café do mundo, que processa 6,3 milhões de sacas por ano de 13 mil produtores. Em dias mais movimentados, Gonçalves chega a provar até cinco famílias de cafés, distribuída em diversas xícaras. Às vezes, ele toma até 40 xícaras. “Não é um trabalho fácil”, diz Gonçalves. “É preciso estudar e ter um paladar apurado para identificar todos os aspectos sensoriais da bebida.”
O técnico agrícola Ronaldo Donizetti da Costa, de 43 anos, há 18 anos segue a mesma trajetória de Gonçalves. Ele analisa e testa cafés, gastando até duas horas por amostra. “É um sistema demorado, porque temos de ter certeza da qualidade do café”, diz Costa. Com a ajuda da Cooxupé, Costa quer dar um novo passo para se aperfeiçoar ainda mais. Atualmente, ele está cursando engenharia química. “Estou me preparando porque a empresa vai precisar de engenheiros para atestar a qualidade dos cafés”, afirma Costa. “Acho que já tenho um grande conhecimento da bebida e quero continuar na cooperativa.”