ESTREIA: na primeira tentativa de reprodução em cativeiro, a empresa obteve 50 milhões de ovos e larvas de atum

No site da empresa de pesca Clean Seas, o belo e o rústico se misturam em fotos inusitadas. Lindas modelos posam em cenários sem nenhum luxo: cais, barcos de pesca e depósitos de peixes. A ideia é reforçar para o consumidor o conceito de sofisticação da gastronomia à base de peixes e frutos do mar. Mas todos os holofotes se voltaram para um dos tanques de engorda do atum-azul, que em março de 2009 amanheceu em meio a um alvoroço incomum.

Segundo Hagen Stehr, fundador da empresa, depois de anos de pesquisa na tentativa de recriar o habitat natural dos atuns em cativeiro, em uma manhã, os peixes começaram a desovar, algo raro de acontecer. Começava aí um trabalho para realizar a reprodução em escala comercial, algo extremamente difícil de ser feito, segundo o professor Fábio Hazin, atual presidente do ICCAT – sigla em inglês para Comissão Internacional para a Conservação dos Atuns do Atlântico. “O Japão e a Austrália já conseguiram realizar essa reprodução em laboratório, mas a maior dificuldade para torná-la comercial é o baixo índice de sobrevivência dos alevinos.”

O atum-azul é, entre todas as variedades da espécie, a mais valorizada no mercado por ser considerado a melhor carne para o sushi e o sashimi, itens da gastronomia japonesa apreciados no mundo inteiro. A combinação do alto consumo com a redução do volume de cardumes faz o peixe ser bastante disputado. Para ter uma ideia, em janeiro, um atum de 232 quilos foi vendido por US$ 175 mil em Tóquio, algo em torno de R$ 300 mil.

US$ 175 MIL foi o valor pago por um atum de 232 quilos comercializado em tóquio

Com esse cenário, Stehr começa a dar grandes braçadas no oceano da lucratividade e hoje exporta para nove países, incluindo o Japão, os Estados Unidos e países da Europa. Segundo relatório da Clean Seas, em março de 2009, na primeira tentativa de experimentação, foram produzidos cerca de 50 milhões de ovos e larvas de atum, número que possibilitou à empresa a reprodução em escala comercial. Os peixes são criados em tanques com água do mar e durante seis meses se alimentam de lulas e sardinhas provenientes de pesca sustentável. O peso dos exemplares frescos varia entre 25 e 40 quilos.

O pioneirismo da Clean Seas na reprodução de atum em cativeiro é uma boa notícia diante do crescente volume de pesca ilegal, que vem deteriorando as populações do atumazul no Atlântico Leste e no Mediterrâneo. Cientistas estimam que a população desse peixe tenha sido reduzida em mais de 90% dos anos 60 para cá. No site da empresa, uma declaração de Stehr explica: “A sustentabilidade não é apenas para o meio ambiente, mas para os peixes e as pessoas envolvidas nessa atividade”. E é mesmo bom que grandes empresas pesqueiras comecem a se preocupar com o assunto.

O professor Frederico Brandini, oceanógrafo da Universidade de São Paulo explica que a diminuição da população de atum pode gerar desequilíbrio entre outras espécies. “Todos os anos, tiramos do oceano, cerca de 100 milhões de toneladas de peixes de todas as espécies, que equivalem a aproximadamente 44 Maracanãs cheios deles, o que é bastante preocupante”, completa.