30/09/2013 - 13:50
Um aroma doce invade o pasto, é reconhecido a uma distância de até 600 metros e abre o apetite do gado. O cheiro marcante que os animais sentem vem do melaço da cana-de-açúcar, subproduto da indústria da cana utilizado como base na formulação de um suplemento alimentar, com vitaminas, proteínas, minerais e aditivos, chamado de Mistura de Umidade Baixa (MUB). Para fabricar o produto no País, a MUB Brasil, uma joint venture entre a americana MBU Technologies LLC e a holandesa De Heus Animal Nutrition, investiu R$ 40 milhões em uma fábrica em Guararapes, no interior paulista, que entrou em operação no mês passado.
A MUB Brasil vai disputar uma fatia de um mercado que movimentou R$ 47 bilhões em 2012 no País, com a venda de 63 milhões de toneladas de rações e dois milhões de toneladas de sal mineral. “Por ser sólido e impermeável, o produto que trazemos para o Brasil é inovador”, diz o americano George Ferre, presidente da MUB Brasil. Os demais suplementos à base de melaço, fabricados por empresas como a Tortuga, a Indumel, a Rumens e a Melaços Brasileiros, são em líquido ou pó. O melaço de cana disputa espaço diretamente com o sal, como elemento base na nutrição animal, mas, diferentemente de seu concorrente, ele tem um sabor muito agradável. “A alta palatabilidade favorece o consumo do produto”, diz o professor Luiz Gustavo Nussio, do departamento de zootecnia da ESALQ/USP, de Piracicaba. “Além disso, o melaço estimula o crescimento microbiano no estômago do animal, melhorando a absorção de outros nutrientes que compõe os suplementos.”
Segundo Nussio, o único problema é que, por ser facilmente dissolvido em água e perder as suas propriedades, seu uso no País tem sido limitado. É nesse ponto que a MUB espera ganhar terreno. A carta na manga da empresa, de tornar o melaço impermeável, é uma tecnologia desenvolvida nos Estados Unidos há mais de quatro décadas pela Ridley, uma das maiores empresas de nutrição animal do mundo. A versão sólida, que lembra um pirulito e começou a ser fabricada no Brasil, nunca havia sido produzida fora dos Estados Unidos. “Estamos trazendo uma categoria de suplementação que ainda não existia aqui”, diz Ferre.
A fábrica construída em Guararapes pode produzir até 240 mil toneladas de suplementos por ano e inicia suas operações com um portfólio de nove produtos. A previsão é processar dez mil toneladas ainda neste ano e fabricar 20 mil toneladas em 2014. Para garantir a matéria-prima, a empresa já firmou parcerias com quatro usinas da região para a compra do melaço. No futuro, a ideia é lançar outros produtos, inclusive a MUB aliada a medicamentos.
A receita das operações, mantida em sigilio, está nas mãos do gerente Éder Nakamune, engenheiro responsável pela fábrica. Segundo ele, o diferencial é o processo de fabricação. “Cozinhamos o melaço a uma temperatura que evita a cristalização do produto, associado a sistemas de vácuo”, diz Nakamune. Depois de desidratado, o melaço é misturado a óleos vegetais, que o deixam impermeável.
Para Ferre, o melaço sólido funciona como um cocho móvel que pode ser levado para pastagens subutilizadas da fazenda, otimizando o manejo do gado. “O Brasil está vivendo o que aconteceu nos estados Unidos no passado, que são pastagens no limite do uso e a necessidade de aumentar a produtividade”, diz Ferre. Em média, cada balde de MUB pode atender 30 animais, ao custo diário de R$ 0,50 a R$ 0,70 por cabeça.
Ariovaldo Zani, vice-presidente executivo do Sindirações, concorda com Ferre. Para ele, a pecuária brasileira tem muito a evoluir. De acordo com seus cálculos, é recomendável o consumo de 30 quilos de suplementos por ano por animal. Caso fosse seguida essa regra, significaria que o rebanho brasileiro deveria absorver seis milhões de toneladas de suplementos minerais, o triplo do consumo atual. “Muitos rebanhos nem recebem suplementação”, diz. “O produtor ainda não entendeu que a nutrição traz melhores resultados para a fazenda.” Segundo ele, comparado aos produtores de aves e de suínos, o pecuarista é o que menos investe na nutrição animal. “Para frangos e suínos, a nutrição chega a 70% do custo de produção”, diz. “O produtor de gado de corte gasta menos de 20%.”
No mês passado, Ferre recebeu na fábrica o sócio-investidor Hendrik Antonie De Heus, da família De Heus, dona da empresa holandesa que faturou no mundo E 2 bilhões. “Estamos dispostos a investir no Brasil porque é um dos mais importantes países para o agronegócio mundial”, diz De Heus. “E tem muito potencial de mercado.” Com a MUB Brasil, até 2018 ele pretende construir outras duas fábricas no País, uma delas na região Norte.