04/09/2019 - 15:36
Conseguir o primeiro emprego é um dos grandes desafios enfrentados pelos jovens brasileiros. Além das dificuldades econômicas que o País ainda atravessa, a falta de experiência costuma ser um robusto obstáculo para quem pretende entrar no mercado de trabalho. Para os que vivem nas regiões rurais, as barreiras costumam ser ainda maiores. Longe dos grandes centros urbanos e com menos acesso a educação e tecnologia, os jovens do campo muitas vezes acabam limitados a subempregos em suas cidades. Essa realidade começa a mudar. De olho nessa fatia da população, o Centro de Integração Empresa Escola (CIEE) montou cursos de capacitação profissional em atividades do agro, voltados para jovens de 18 a 24 anos. As primeiras turmas foram iniciadas em abril, com aulas direcionadas a diversas áreas, como lavoura de cana-de-açúcar, mecanização de culturas e magarefe.
Segundo o coordenador do programa, o administrador de empresas Mateus Rubiano, 44 anos, nos cursos os aprendizes recebem noções de conceitos mais amplos – como o uso da língua portuguesa e da matemática no desenvolvimento de soluções e processos específicos do trabalho –, mas também têm acesso a ensinamentos técnicos específicos de suas áreas. Entre essas atividades, estão o preparo de sementes e insumos, realização do beneficiamento da colheita, operação de máquinas agrícolas, emprego de medidas de segurança, o uso de novas tecnologias e modelos econômicos do agronegócio. “As inovações tecnológicas estão cada vez mais presentes no campo. Em tempos de agricultura 4.0, nossos jovens precisam receber esse tipo de conhecimento já no início da carreira”, afirma Rubiano. “Nossa meta é beneficiar a garotada das áreas rurais do País, que tem menos acesso ao mercado de trabalho”, destaca. Os jovens também recebem aulas de temas como Indústria no Século 21, Estrutura de Mercado e Microeconomia Aplicada ao Agronegócio.
Os cursos destinados ao segmento são divididos em dois grupos. Um, chamado de “Arcos do Agro”, é voltado principalmente ao setor de energia e inclui atividades na cultura de cana-de-açúcar, trabalho volante em plantações e operador de máquinas. “Com a modernização do campo, é cada vez mais imprescindível formarmos bons operadores”, observa Rubiano. Segundo ele, há usinas com máquinas que chegam a custar R$ 1 milhão, mas que não dispõem de profissionais qualificados a operá-las. O outro módulo de cursos é direcionado aos frigoríficos e foca na atividade de magarefe, com especialidades de açougueiro, refilador e embalador. “O magarefe é um profissional em escassez. É cada vez mais raro um bom trabalhador nessa área”, destaca. “Os que estão empregados sofrem até assédio de outros frigoríficos. Tanto que as empresas oferecem bons salários, de até R$ 5 mil”.
Para identificar os cursos que iriam oferecer no setor do agro, Rubiano e sua equipe contataram diversas usinas, fábricas e frigoríficos, num trabalho que despendeu quase 1 ano de viagens, visitas e reuniões. “Precisávamos entender as necessidades das empresas, identificar suas demandas e, a partir daí, estruturar os cursos que iriam atender a essa procura”, explica o coordenador do CIEE. Hoje, há 300 jovens – de 18 a 24 anos – matriculados nos cursos do agronegócio, distribuídos em 120 cidades do País. Entre as empresas parceiras, estão duas gigantes do segmento: JBS – uma das maiores companhias de alimentos do mundo – e Tereos – fabricante francesa de açúcar, amido e bioetanol. “Há muito espaço para crescermos. Já temos várias empresas interessadas nesse programa. Nossa meta é terminar o ano de 2020 com 6 mil alunos”.
Nos rincões
DO BRASIL Com os novos cursos, o CIEE entra, pela primeira vez, nos campos do Brasil. Até então, todas as formações oferecidas pela instituição aos jovens eram voltadas a atividades internas, em escritórios. “Como cerca de 70% dos profissionais das grandes empresas do agro estão nas zonas rurais, tivemos de entrar nas fazendas, nas usinas e nas lavouras”, destaca Rubiano.
O superintendente geral do CIEE, o engenheiro de produção Humberto Casagrande, 61 anos, reforça a importância da nova investida da instituição, para o mercado e para os jovens. “A profissionalização da mão-de-obra é uma necessidade crescente do agronegócio nacional. E há muita gente interessada em se preparar para ocupar as vagas disponíveis”, ressalta Casagrande. “Estamos trabalhando fortemente para ajudar na solução desse problema”.
Outro ponto destacado pelo executivo é a mudança na visão que as empresas têm dos estagiários e aprendizes. De acordo com Casagrande, antes esses jovens eram vistos pelas companhias como um peso, uma obrigação a ser cumprida – a Lei determina que as empresas devem ter de 5% a 15% do seu quadro ocupado por estagiários. Hoje, a história é outra. “As empresas perceberam que esses jovens não são um problema e, sim, um excelente instrumento de trabalho”, observa Casagrande. “Eles são muito empenhados e interessados. Muitas vezes, produzem mais do que os profissionais”. Os fatos comprovam a satisfação das companhias. “Não temos nenhum ex-cliente. Ou seja, nenhum caso de empresa que era nossa parceira e deixou de trabalhar com o CIEE”, afirma.
Hoje, a instituição tem parceria com mais de 30 mil companhias, dos mais diversos setores, como sistema financeiro, educação, automotivo e, mais recentemente, o agronegócio. Tudo isso reflete no excelente faturamento da entidade, que não tem fins lucrativos. Em 2018, o CIIE faturou R$ 300 milhões. Para este ano, a previsão é de alta de 7%, chegando aos R$ 320 milhões. “Somos uma instituição de alma filantrópica ssse braços empresariais”, resume Casagrande. A boa nova para o agronegócio nacional é que esses braços já estão trabalhando a favor do setor.