A natureza não aceita o vácuo”, disse a agrônoma Mônika Bergamaschi, presidente do Instituto Brasileiro para Inovação e Sustentabilidade do Agronegócio (Ibisa). E prosseguiu. “Precisamos ocupar espaços, participar mais, fortalecer nossas associações, nossas cooperativas, nossos sindicatos e as instituições brasileiras de modo geral. Há muito a fazer e não há tempo a perder.” O discurso foi aplaudido de pé por uma plateia de 1,1 mil mulheres de todo o País, durante o 2º Congresso Nacional de Mulheres do Agronegócio, em São Paulo, no mês passado, promovido pela Associação Brasileira de Agronegócio. Durante dois dias, foi cumprida uma agenda de temas variados. De superação de desafios de gênero, ética e valores, a drones na agricultura, bem-estar animal, sucessão, gestão e a preparação de lideranças para integrar cadeias de valor. Não por acaso, nos amplos espaços preparados para o encontro que aconteceu no Expo Transamérica, os intervalos entre os 22 painéis e workshops se transformaram em uma síntese do que ocorre no campo: cada vez mais, as mulheres estão se preparando para a tarefa de produzir alimento e querem mais do que serem apenas coadjuvantes no processo, elas querem o protagonismo.

Parte do ineditismo do congresso foi a apresentação da fase dois da pesquisa “Todas as Mulheres do Agronegócio”. A primeira fase foi realizada no ano passado. Dessa vez, 862 mulheres que atuam no setor – antes, dentro e depois da porteira – participaram do processo. A base para a pesquisa foi fornecida pela Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA), o que tornou o seu universo pouco variado. Mesmo assim, ela fornece pistas preciosas do que ocorre no setor. Um exemplo é a disposição à liderança: 61,1% das mulheres não vêem nenhum problema de gênero para exercê-la, embora 74,2% acreditem haver preconceito evidente ou sutil no trabalho. Para José Luiz Tejon Megido, diretor do Núcleo de Estudos de Agronegócio da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e sócio da Biomarketing, consultoria de conteúdo do congresso, a participação das mulheres em todos os segmentos tende a ser cada vez maior. “As mulheres dizem que se sentem totalmente preparadas para esse desafio. A pesquisa mostrou que mais da metade delas tem essa convicção e outras 40% se sentem parcialmente preparadas”, afirma Megido. “E estão mesmo, porque já romperam muitas barreiras e preconceitos, se preparam para o futuro e não vão parar.” Em um universo de 16 áreas nas quais as mulheres mais têm interesse por conhecimento, estão no topo gestão de pessoas e empresarial, finanças, Bolsa de Valores, negociação e tecnologia.

Para Chanda Berk, diretora do U.S. Agricultural Trade Office (do inglês, Escritório de Promoção Comercial de Alimentos e Bebidas do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos), a mulher no campo e nos diversos papéis na sociedade, não é um tema novo. Mas é preciso um trabalho de comunicação e um olhar mais aprofundado para entender o que elas estão fazendo nos dias de hoje, em uma agricultura muito mais moderna. “É preciso contar histórias”, disse ela, durante um painel no qual o centro do debate foi o papel da liderança feminina em uma era globalizada. “Mulheres, contem as suas histórias. Eu vou sair daqui e contar a história de vocês, desse congresso.”

Uma dos relatos no congresso foi o de Julia Buschmann, uma das herdeiras do Grupo Buschmann e neta de Rubens Carlos Buschmann, criador da empresa na década de 1970. No caso de Julia, ela falou sobre a sucessão dos negócios da família que se dedica à pecuária e à agricultura. O plano que começou há cinco anos. “É um processo a ser pensado a cada passo, precisa de responsabilidade”, disse ela. “É preciso estar preparada para a transparência das operações.” Júlia, que tem 28 anos, é administradora de empresas e trabalha nas fazendas.

“Precisamos ocupar espaços, participar mais, fortalecer nossas associações” Mônica Bergamaschi , presidente do Ibisa (Crédito:Kelsen Fernandes)

Para as mulheres de setores do agronegócio que trabalham fora das fazendas, Flávia Ramos, diretora de recursos humanos na alemã Bayer Crop Science, afirma que ainda não existe uma igualdade em posições de liderança, mas que a presença de mulheres tem crescido no meio corporativo. “Na Bayer, o crescimento das mulheres em posições de liderança foi de 11% nos últimos anos, enquanto que o de homens tem sido de 8%”, diz ela. “Mas a proporção ainda é pequena e os esforços precisam se intensificar.” Mariana Lorenzon, diretora de excelência operacional da Bayer, está na divisão de agronegócio desde 1995, e acompanha esse processo. “Quando comecei era muito diferente de hoje”, afirma ela. “As mulheres estão disputando espaços e aproveitando as oportunidades.”

Para Lair Hanzen, presidente da norueguesa de fertilizantes Yara Brasil, hoje as mulheres estão dizendo que querem assumir posições. “Dados de pesquisas mostram que as empresas com mulheres em cargos de liderança têm apresentado um desempenho melhor”, diz. “Na Yara, para a escolha desses cargos já quebramos paradigmas refazendo processos porque na lista tríplice final não havia uma mulher na disputa. O ambiente nas empresas ainda é notadamente masculino e o preconceito, infelizmente, ainda existe.” A Yara tem 15 mil funcionários no mundo e faturou globalmente no ano passado US$ 11,5 bilhões. Nos últimos 15 anos, o Brasil se tornou o mercado mais importante, entre os 160 nos quais atua. O País representa um quarto de suas vendas, com meta de aumento dessa fatia, e as mulheres têm sido chamadas para essa tarefa.