E m um único dia, os bancos ingleses perderam 100 bilhões de libras esterlinas, o valor dos mercados acionários globais encolheu US$ 2 trilhões e a moeda inglesa atingiu o valor mais baixo desde setembro de 1992. Ao fim da sexta-feira, 25 de junho, um dia depois que os britânicos votaram a favor do Brexit, a saída do Reino Unido da União Europeia, o cenário no mercado financeiro mundial era de terra arrasada. O evento, de magnitudes colossais, marcou a ruptura de uma Europa unida e foi comparado à queda do muro de Berlim, quando a cortina de ferro que separava o socialismo do capitalismo caiu. Agora, uma nova onda de protecionismo promete tomar conta da União Europeia. E o agronegócio está no centro dessa discussão. Afinal, o País ganha ou perde com o Brexit? Do ponto de vista dos negócios diretos com o Reino Unido, a tendência é o Brasil sair vencedor. De acordo com a consultoria MacroSector, a saída dos britânicos do bloco comum europeu facilita a costura de um acordo bilateral e deve impulsionar as exportações brasileiras para o país.


Hora de arrumar a casa: bandeira do Reino Unido é retirada do parlamento europeu. Onda de protecionismo é esperada

O economista Otto Nogami, professor do Insper, de São Paulo, faz coro. “A França, por exemplo, atrapalha muito a fluidez das negociações dentro da União Europeia através de barreiras econômicas e sanitárias”, diz ele. Livre dessa influência, o Reino Unido passa a ter mais liberdade. “Abrem-se oportunidades para que o Brasil aumente as exportações de grãos, de alimentos processados e de bebidas”, diz. Trata-se da chance de, literalmente, virar o jogo que vem sendo praticado nas relações com os britânicos. Nos últimos cinco anos, as exportações do agronegócio brasileiro para lá têm sido cada vez menores.  Em 2015, as vendas para o Reino Unido totalizaram US$ 1,37 bilhão, uma queda de 28,3% em relação a 2011. A madeira, a soja e as frutas encabeçam a lista dos produtos mais embarcados ao país da rainha Elizabeth II. A meta é incrementar a balança comercial, sobretudo, com exportações de proteína animal. É o caso do setor produtor de carne de frango, que contrariou a tendência de queda e viu os embarques crescerem 14%, nos últimos cinco anos, com a venda de 77,5 mil toneladas no ano passado. “Se o Reino Unido criar um sistema independente de cotas, as possibilidades de nossas exportações aumentarem são muito maiores”, diz Ricardo Santin, vice-presidente de mercados de aves da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).

Se, por um lado, o comércio com o Reino Unido pode aumentar, por outro, a entrada dos produtos brasileiros nos 27 países membros da União Europeia deve encontrar dificuldades. Até o resultado do Brexit sair, o primeiro-ministro David Cameron, que renunciou ao cargo e deve permanecer até outubro, era o maior fiador do Mercosul em uma negociação de livre comércio com a União Europeia. Agora, o bloco sul-americano se vê órfão e encontrará um bloco europeu muito mais protecionista do que antes. Dias depois do resultado do referendo, os ministros da agricultura dos países europeus se reuniram na Comissão Europeia e pediram a liberação de um pacote de E 500 milhões para socorrer produtores. Alemanha, França, Itália, Espanha e Polônia também solicitaram à Comissão o aumento de subsídios aos produtores e a implantação de mecanismos que aumentem as exportações. Barreiras protecionistas contra a carne vinda de fora também não estão descartadas, numa reação que vai contra ao processo de globalização. O Velho Continente parece ter voltado aos velhos tempos.