Durante a campanha, o governador Beto Richa assumiu uma série de compromissos com o agronegócio do Paraná. Entre eles, a liberação dos transgênicos e a pacificação do campo

E m menos de 100 dias no cargo, o governador paranaense, Beto Richa, desfez alguns dos atos mais polêmicos de seu antecessor, Roberto Requião. Entre outras providências, desistiu de combater o plantio de sementes transgênicas, deixando a decisão de sua utilização ou não por conta dos agricultores, requisitou a Polícia Federal para investigar supostas irregularidades na gestão do porto de Paranaguá e determinou o cumprimento de mandados de reintegração de posse em áreas rurais. Eleito com o apoio das lideranças do setor, Richa diz que conta com o agronegócio para governar o Paraná. “Sempre encarei o produtor rural como um aliado do desenvolvimento”, afirmou.

 

 

DINHEIRO RURAL – Antes de ser eleito, o sr. era visto como uma esperança para o agronegócio. O produtor rural se sentia prejudicado por atos polêmicos do antigo governador Roberto Requião. Como pretende reverter a situação deixada pelo seu antecessor?

BETO RICHA – Sempre encarei o produtor rural como um aliado do desenvolvimento. Meu plano de governo já deixava bem claro que agricultura, meio ambiente e indústria são áreas que se conciliam em favor do desenvolvimento e, nesse caso, o primeiro interessado é o próprio agricultor. O agronegócio é a principal atividade geradora de empregos no Paraná e importante fonte de geração de divisas para o País. Por isso, uma gestão harmoniosa entre as secretarias do governo estadual e o setor produtivo será fundamental para o agronegócio paranaense voltar a ter o equilíbrio e incentivo de que necessita e retomar o que perdeu.

RURAL – Como será alcançada essa administração harmoniosa?

RICHA – Todos irão trabalhar em conjunto em prol de uma estratégia: o desenvolvimento com base na agroindústria sustentável e um diálogo transparente entre governo e o setor produtivo. Em janeiro, reunimos todos os secretários e entidades representativas do setor, como a Federação da Agricultura (Faep), a Organização das Cooperativas do Estado (Ocepar) e a Federação dos Trabalhadores Rurais (Fetaep), para discutir as questões mais urgentes.

RURAL – Quais foram essas questões mais urgentes?

RICHA – Pacificação no campo, o cumprimento de mandados de reintegração de propriedades rurais; o incentivo à agroindustrialização e à agropecuária sustentável; o incentivo à pesquisa, que ficou sucateada nos últimos anos e, finalmente, soluções para o porto de Paranaguá. A Polícia Federal está lá, investigando, para sabermos por onde começar. Todas essas questões constarão do projeto de lei que cria a Agência Paraná de Desenvolvimento, a ser enviado em breve à Assembleia Legislativa.

 

 

“A Polícia Federal está fazendo uma devassa no porto de Paranaguá. Existiam muitas denúncias de irregularidades”

 

RURAL – O porto de Paranaguá virou um caso de polícia?

RICHA – Sim. A real situação do porto de Paranaguá está sendo investigada pela PF. Existiam muitas denúncias de irregularidades na antiga gestão. Por isso, a PF está fazendo uma devassa no porto, que também teve sua credibilidade bastante arranhada nos últimos anos por conta da questão dos transgênicos e da falta de investimentos.

 

RURAL – Já tem uma ideia de quanto será necessário investir no porto antes de a investigação terminar?

RICHA – Para recuperar o tempo perdido, elaboramos um plano de investimento de curto, médio e longo prazos, dividido em nove lotes de obras que somam R$ 1 bilhão. Parte das obras será paga com recursos do porto, parte com recursos federais e há ainda investimentos da iniciativa privada, que havia se afastado, mas está voltando.

RURAL – Os planos de curto prazo já começaram a ser executados?

RICHA – Sim. Já executamos a dragagem de berços, o que não era feito há anos, ao custo de R$ 2,5 milhões, com dinheiro do porto. Agora, faremos a dragagem de manutenção dos canais, com R$ 100 milhões. Até maio, devemos conseguir a licença ambiental e, depois, abriremos licitação, pois esse tipo de dragagem precisa ser feito periodicamente para conservar as condições operacionais do porto. Já iniciamos também os estudos para ampliar os cais costáveis. A ideia é ampliar a capacidade atual, de 38 milhões de toneladas por ano, para 60 milhões de toneladas por ano.

RURAL – O sr. tem ideia de quanto foi perdido com a proibição do escoamento dos grãos transgênicos e o afastamento da iniciativa privada?

RICHA – Não sabemos ao certo. O governo anterior desencorajou o plantio dos transgênicos, mas o produtor não deixou de plantar esse tipo de semente. O que houve é que, em vez de escoar a produção por Paranaguá, ele a embarcava em outros portos, como Itajaí e São Francisco. Esses portos tiveram sua movimentação de cargas ampliada à nossa custa. A situação só terminou na safra 2008/09, quando não houve mais problemas

com as exportações de soja transgênica.

 

 

RURAL – O sr. vai incentivar a produção de transgênicos no Paraná a partir de agora?

RICHA – O aumento das áreas cultivadas fica a cargo do produtor, de acordo com o mercado. Nós vamos investir na infraestrutura de logística e transporte. Não há razão para impedirmos o cultivo e a comercialização de transgênicos. Seguimos as normas da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CNTBio), e isso é suficiente. Vamos apoiar os produtores. Transgênicos ou não, é importante lidar com as duas culturas, sem favorecimentos e sem preconceitos.

 

“O aumento das áreas cultivadas com transgênicos fica a cargo do produtor. Nós investiremos na infraestrutura”

 

RURAL – O incentivo à agroindustrialização no Estado dará continuidade à tradição do cooperativismo?

RICHA – Sim. O Paraná já é modelo no setor. Um Estado que abriga a maior cooperativa agrícola do mundo, a Coamo, tem potencial e condições para ir mais longe. É condição prévia para o nosso desenvolvimento a inserção competitiva da agropecuária no mercado mundial, agregando valor aos produtos primários, especialmente no modelo cooperativista, em que o agricultor é coproprietário da indústria. Isso assegura maior participação no preço final e o reinvestimento dos lucros no Estado. Nossa gestão vai incrementar fortemente a agroindustrialização e a Agência Paraná vai articular os mecanismos de incentivo, com apoio às indústrias locais e atração de novos investimentos por meio de benefícios fiscais, infraestrutura, capacitação profissional e fluxo de recursos para o financiamento do setor.

RURAL – A Agência Paraná de Desenvolvimento foca o crescimento na agroindústria exclusivamente com base em grãos ou também em outras culturas?

RICHA – Todos os setores estão dentro do projeto. Podemos destacar a cana-de-açúcar. O setor continua se expandindo, sobretudo na região do Arenito, no noroeste do Paraná, e ganhará um novo impulso com o poliduto Maringá-Paranaguá, que transportará etanol do Noroeste para o porto.

 

 

RURAL – Uma das prioridades do seu governo é pacificar o campo. Como isso está sendo trabalhado?

RICHA – O governo tem interesse em pacificar as relações no campo e assegurar o direito de propriedade. As áreas invadidas são objeto de negociação, amparada numa profunda análise da situação jurídica e social de cada caso. Vamos usar, preferencialmente, a negociação com os movimentos sociais. Isso ocorrerá mediante a implementação de uma política de crédito fundiário, de negociação de propriedades para novos assentamentos junto ao Incra e, principalmente, com assistência técnica e social aos assentamentos já existentes.

 

RURAL – Como o seu governo está lidando com problemas que afligem os proprietários rurais, como o não cumprimento de mandados de reintegração de posse?

RICHA – Os mandados já expedidos estão sendo executados e, das 72 áreas rurais com pedidos de reintegração de posse no Paraná, 40 já tiveram as pendências resolvidas neste ano, ou estão em negociação avançada.

RURAL – Com a possível votação da reforma do Código Florestal, poderá haver mudanças nos planos do governo?

RICHA – Não. Desde o início nossas metas foram planejadas de acordo com o meio ambiente. O substitutivo elaborado pelo relator, deputado Aldo Rebelo, após exaustivas audiências públicas, não é o ideal, mas significa um avanço importante para o apaziguamento das relações entre a agricultura e o poder público no que se refere ao meio ambiente. A proposta delega aos Estados a implementação de programas de regularização ambiental, mesmo na pequena propriedade, abaixo de quatro módulos fiscais, e estabelece moratória de cinco anos para qualquer corte de vegetação nativa. Por isso, o Paraná apoia a aprovação do novo Código Florestal na forma proposta pelo relator. Será complementar.