Quem viaja pelo sul do Estado de Goiás, nas redondezas de Quirinópolis, e vê aviões de pequeno porte sobrevoando as lavouras de soja, poderá pensar, à primeira vista, que essas operações nada mais são do que meras aplicações aéreas de algum defensivo, uma cena muito comum em todo o Centro-Oeste. O que poucos sabem é que, nos últimos tempos, agropecuaristas, como Heinz Guderian Jacinto, dono de 200 hectares no município, estão utilizando as aeronaves com uma finalidade adicional: espalhar sementes de capim sobre as lavouras de soja, técnica chamada de sistema de sobressemeadura aérea. Ou, em português menos complicado, semeadura feita com a utilização de aviões. “Há três anos comecei a fazer a sobressemeadura e ela tem facilitado nossas operações, porque conseguimos otimizar o tempo na fazenda”, diz Jacinto. “Em apenas duas horas, é possível semear toda a minha propriedade com o avião”. Nas regiões Sul e Sudeste, principalmente nas áreas de pecuária, semear uma cultura sobre a outra não é novidade para os produtores que utilizam a técnica com o fim de garantir pasto de inverno ao gado. A novidade, no caso da região de Quirinópolis, é justamente a utilização da aviação. Na fazenda de Jacinto, por exemplo, até três anos atrás, com uma plantadeira convencional, a chamada semeadura a lanço (lançada no ar pela máquina), o produtor levava no mínimo dois dias para realizar o mesmo trabalho.


Entusiasta: David Campos, dono das Sementes Moeda, foi um dos responsáveis pelo desenvolvimento do sistema São Francisco de sobressemeadura

A modernização do sistema de semeadura traz benefícios à gestão das fazendas. O principal deles é a redução à metade do uso de sementes, pois não há desperdício no plantio. Para Leonardo Correa da Silva, sócio da Aero Terra, baseada no município de Luís Eduardo Magalhães, no Oeste baiano, esse tem sido o principal motivo do crescimento da sobressemeadura na região. “É uma técnica barata”, diz Correa da Silva. Cada hectare semeado tem um custo de cerca de R$ 30 pelo voo e de cerca de R$ 70 para a compra da semente. Pelo plantio convencinal, o gasto chegaria a R$ 140. “Aqui na região, a sobressemeadura aérea tem melhorado a produtividade da área plantada da soja”, diz Correa da Silva. No plantio direto, quanto mais palha estiver incorporada ao solo, melhor será o desenvolvimento da planta.

O produtor Jacinto também está utilizando a sobressemeadura para impulsionar a chamada Integração-Lavoura-Pecuária (ILP) em sua propriedade. De acordo com ele, antes do avião, o uso de sementes na área de ILP chegava a 20 quilos por hectare. Atualmente, é a metade. “Tivemos uma grande economia com essa ferramenta”, diz Jacinto. “Além disso, houve uma melhora na qualidade da pastagem, que passou a nascer mais uniforme”. O produtor utiliza na área de soja o capim-mombaça, que pode formar touceiras, caso a semente não sejabem distribuída no solo.

Para fazer a semeadura aérea em sua propriedade, Jacinto contratou os serviços da Aerotek, também de Quirinópolis. De acordo com o engenheiro agrônomo Diêgo Santos Martins, coordenador de operações da Aerotek, os produtores estão começando a se interessar pela sobressemeadura aérea, mas essa atividade requer muita informação adicional aos candidatos a usuários. Segundo ele, sua empresa atende atualmente 25 clientes, que estão experimentando a ferramenta. “A área é de dois mil hectares, mas tende a aumentar à medida que os produtores se convencerem de que não há perda de lavoura.” Tradicionalmente, o sistema de sobressemeadura pressupõe plantar uma cultura, como a da aveia, por exemplo, em cima da pastagem. Por isso, a utilização de máquinas para fazer o lanço das sementes é muito comum, pois não há a mínima possibilidade de danificar o pasto. No caso da semeadura de capim em cima da soja, realizada, cerca de 30 dias antes da colheita, quando as folhas da oleaginosa começam a amarelar, o uso de máquinas pode levar a perdas de produtividade. “Com o avião, isso não acontece”, diz Martins.

Para difundir o método aéreo na região de Quirinópolis, há dois anos a Sementes Moeda, do empresário David Campos fez uma parceria com a Aerotek e com a unidade de Brasília da Embrapa Cerrados. O grupo batizou a sobressemeadura aérea de sistema São Francisco. De acordo com Campos, os produtores que estão testando o sistema conseguem colocar até quatro animais, por hectare, em fase de engorda, nos pastos onde antes havia agricultura. “Com 60 dias de engorda, nos meses de pico de seca, quando na maior parte das fazendas falta comida para o gado, esses bois podem ganhar cerca de 1,5 arroba”, diz Campos. Segundo o empresário, a sobressemeadura com o capim-mombaça em sua região é altamente rentável para a criação de bois. Levando em conta que o custo da técnica é de R$ 150, por hectare, e que o ganho pode chegar a um adicional de seis arrobas de boi gordo, a receita da área obtém um aumento de R$ 690. “Isso, com a arroba a R$ 140 pagos pelo frigorífico”, diz Campos. “Só vejo vantagens econômicas para o produtor.”

Voando alto
Embraer investe no espaço aéreo agrícola

As possibilidades de uma maior utilização do avião no agronegócio está aguçando o apetite dos fabricantes do setor aeronáutico. É o caso da Embraer, de São José dos Campos, que investiu US$ 800 mil para desenvolver a nova versão do avião agrícola Ipanema, que já tem mais de 1,3 mil unidades vendidas no Brasil. “O Ipanema tem flexibilidade para operações diversificadas e a sobressemeadura é uma de suas muitas possibilidades”, diz Alexandre Sólis, diretor da unidade da Embraer, em Botucatu, no interior paulista. “O Ipanema 203, foi desenvolvimento a partir da demanda dos clientes, que solicitavam uma aeronave mais confortável e com melhor rendimento.” Com o lançamento, a expectativa da empresa é vender 38 unidades do Ipanema 203, neste ano.