No mês passado, mais precisamente na noite do dia 26 de maio, o Late Show, um dos programas de entrevistas mais famosos dos Estados Unidos, apresentado por Stephen Colbert, teve um encontro inusitado: o do roqueiro canadense Neil Young, 70 anos, com um figurante vestido de espiga de milho, nesse caso, transgênica. Ferrenho opositor da tecnologia, tendo, inclusive, composto canções contra os organismos geneticamente modificados (OGMs), Young teve de encarar seu “inimigo”, nove dias depois de ser publicado o estudo “Lavouras modificadas geneticamente, experiências e prospectos”, da Academia Nacional de Ciências, Engenharia e Medicina dos Estados Unidos. A publicação trouxe mais luz às discussões que envolvem a tecnologia, avaliando que é tão seguro o consumo de um alimento transgênico como o de um vindo de uma lavoura tradicional. Colbert foi bem incisivo: “você ainda acredita que os alimentos transgênicos fazem mal, mesmo com esse estudo?.” Irredutível, Young disparou: “Esse estudo deve ser um pronunciamento da Monsanto”, referindo-se à multinacional americana fabricante de sementes transgênicas. E prosseguiu. “Por que 38 países baniram os OGMs? Os governos desses países estão preocupados com suas populações. Eles querem protegê-las.”


“Foi valioso ter uma publicação que fez uma análise concisa e embasada sobre esse tema” Adriana Brondani,
diretora-executiva do CIB

Apesar das acusações de ter sido criado para o benefício de empresas interessadas na comercialização de tecnologias transgênicas, o estudo, de fato, traz mais ciência ao debate. Ele revela a análise de um comitê especial que examinou cerca de 900 pesquisas e outras publicações sobre o desenvolvimento, o uso e os efeitos de características de engenharia genética no milho, na soja e no algodão. Adicionalmente, o comitê ouviu 80 especialistas no assunto, para, no final, compilar 388 páginas com informações tanto dos aspectos agronômicos quanto da segurança alimentar. Para o diretor geral da consultoria Agroicone, Rodrigo Lima, não há motivo para se discutir a idoneidade da instituição. “Trata-se de uma entidade técnica que possui muita credibilidade”, diz. Lima e os demais especialistas do agronegócio enxergam na divulgação de estudos como esse a saída para acabar com todo o preconceito gerado contra os transgênicos. “Tem de acabar com essa percepção do medo.” A bióloga Adriana Brondani, diretora-executiva do CIB, compartilha da mesma opinião. “Para nós, que já sabíamos da segurança dos transgênicos, foi valioso ter uma publicação que fez uma análise concisa e embasada sobre esse tema”, diz. Para ela, isso não significará a criação de novos mercados consumidores, mas contribuirá para o maior esclarecimento do consumidor.


“A Europa não autoriza o cultivo, mas permite, de certa forma, a compra de produtos de lavouras OGM” Anderson Galvão,
presidente da consultoria Céleres

Os transgênicos já fazem parte da nossa realidade há 33 anos, quando o primeiro OGM foi obtido. Tratava-se de uma espécie de tabaco resistente a um tipo de antibiótico. De lá para cá, os transgênicos encontraram um campo fértil na agricultura. Os dados de plantio, de 2015, apontam para 179,7 milhões de hectares cultivados em 28 países, segundo o Serviço Internacional para a Aquisição e Aplicações em Agrobiologia (Isaaa, na sigla em inglês). O Brasil surge como o segundo maior, com uma área de 44,2 milhões de hectares, ficando atrás somente dos Estados Unidos, com 70,9 milhões. No País, são cultivadas lavouras transgênicas de soja, milho, algodão, feijão e eucalipto. Mas a tendência é que o cultivo cresça ainda mais ao redor do mundo. Segundo o engenheiro agrônomo Anderson Galvão, presidente da consultoria Céleres, de Uberlândia (MG), filiada ao Isaaa, pressões por parte de produtores europeus aumentam cada vez mais. “Estão percebendo que os produtores brasileiros, argentinos e americanos, por exemplo, estão se beneficiando com a tecnologia”, diz Galvão. “A Europa não autoriza o cultivo, mas permite, de certa forma, a compra de produtos de lavouras OGM”. “E eles querem fazer parte desse grupo.”