06/03/2021 - 10:00
O Congresso reestimou a arrecadação da União em 2021, apesar dos efeitos previstos da pandemia na economia, para turbinar a indicação de emendas parlamentares – recursos destinados a obras e projetos definidos por deputados e senadores. A Comissão Mista de Orçamento aprovou nesta semana parecer preliminar da Lei Orçamentária Anual (LOA) reservando um total de R$ 51,8 bilhões para emendas, dos quais R$ 14,5 bilhões vão para despesas fora do teto de gastos, como o Fundeb e capitalização das estatais.
Técnicos avaliam que o plano original era atrelar essas receitas extras ao movimento para livrar o Bolsa Família do teto de gastos, que acabou sendo frustrado após o time do ministro da Economia, Paulo Guedes, entrar em campo contra a articulação. Agora, os congressistas tentam costurar outras saídas para usar o dinheiro.
O aumento do valor reservado para emendas foi feito após a reestimativa da receita para o ano de 2021, gerando um adicional de R$ 35,3 bilhões com a expectativa de aumentar a arrecadação e de cancelar R$ 1,6 bilhão de despesas originalmente planejadas pelo Executivo, conforme parecer preliminar do senador Marcio Bittar (MDB-AC). A estratégia não é suficiente para aumentar as despesas no montante pretendido pelo Congresso em função da trava do teto de gastos, a regra que impede que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação. Além disso, a arrecadação pode não ocorrer, forçando o Executivo a bloquear os repasses ao longo do ano.
Só de emendas indicadas diretamente pelo relator-geral do Orçamento, o relatório de Bittar reserva R$ 35,6 bilhões, que poderão ser alocadas em projetos de interesse eleitoral, entre eles infraestrutura e programas sociais. O parecer cria expressamente a autorização para a indicação dessas emendas, que não estão previstas na Constituição nem na Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO). “Esses ajustes, promovidos a partir de emendas do relator-geral, podem decorrer, inclusive, de solicitações do Poder Executivo, encaminhadas por meio de ofícios expedidos pelo Ministério da Economia, ou de outras demandas que tenham a finalidade de melhorar a alocação dos recursos públicos”, justificou o senador no documento.
Do total, R$ 14,5 bilhões poderão abrigar indicações dos parlamentares para despesas fora do teto de gastos. Bittar prometeu colocar o valor na complementação da União ao Fundeb, a pedido da deputada Dorinha Seabra (DEM-TO). Pela Constituição, essa despesa já fica fora do teto. As emendas para o Fundeb podem ajudar o governo a cumprir o repasse de R$ 19,6 bilhões que precisa fazer ao financiamento neste ano. Desse total, 73% estão travados no Orçamento e dependem da aprovação de um outro projeto de lei para que o Executivo possa descumprir a regra de ouro.
Reação
O parecer preliminar provocou questionamentos sobre a possibilidade de o Congresso usar o Orçamento e burlar a regra do teto. Para o consultor Ricardo Volpe, da Câmara dos Deputados, porém, essa reserva só poderá ser usada para despesas já retiradas do teto pela Constituição, como Fundeb e aporte de capital em estatais, como o feito na Emgepron, estatal militar, em dezembro de 2019.
Volpe chama a atenção para a incerteza sobre a arrecadação projetada pelo Congresso, o que pode impossibilitar o pagamento dos repasses indicados pelos parlamentares. “Não dá para saber. O Executivo solta a avaliação (de receitas e despesas do governo federal) no final de março. Muitas incertezas.”
Na quinta-feira, durante sessão da comissão de Orçamento, Bittar foi questionado sobre as emendas de relator e garantiu que o teto será respeitado. “Não existe R$ 35 bilhões para o relator fazer o que quiser. O Orçamento já está no limite do teto. Eu não tenho esse dinheiro, mas, se eu somasse os valores que os parlamentares me pediram, talvez desse mais um pouco.”
Além do volume de emendas do relator do Orçamento, parlamentares apresentaram um total de R$ 47 bilhões em emendas para o Orçamento de 2021, somando as indicações individuais (de cada deputado e senador), as de bancada (conjunto de parlamentares de um mesmo Estado) e as de comissão. O valor é quase três vezes maior do que o reservado para emendas impositivas (R$ 16,2 bilhões) e supera o volume das indicações de anos anteriores.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.