10/07/2017 - 8:00
Como sabe todo produtor rural, a rotina diária do trabalho no campo não conhece domingo, feriado e nem distingue hora. Seja no manejo agrícola ou no trato com os animais, é preciso estar sempre de prontidão. Boi não sabe que existe calendário e sente fome o tempo todo, assim como a semente pode germinar a qualquer momento, mesmo que seja na folga de fim de semana. Dessa forma, se, por exemplo, a chuva necessária para o plantio chegar no sábado ou domingo, é preciso mobilizar máquinas e homens para não perder a oportunidade. O mesmo ocorre na hora da colheita, que não obedece horário comercial, com pena de comprometer a qualidade do produto final.
Se assim é a lei da natureza, as leis e normas que regulam as relações trabalhistas dos que atuam no agronegócio precisam ser aprimoradas, modernizadas e, sobretudo, flexibilizadas, de forma a dar possibilidade de se adaptar às necessidades inerentes à atividade de criar, plantar e colher. O sistema trabalhista atual vem de meados do século passado e foi elaborado para o mundo urbano. Nos diversos congressos e fóruns promovidos pela ABAG ao longo dos últimos anos, sempre que o tema das relações trabalhistas entra na pauta de discussão, é unânime a avaliação de que a legislação do trabalho no campo precisa levar em conta que a atividade agrícola e a pecuária, em todas as suas diversas cadeias produtivas, seguem um calendário diferente da rotina do trabalhador urbano. Pela relevância e urgência dessa questão que tem levado incerteza jurídica ao campo, é que no próximo congresso da ABAG, a ser realizado no dia 7 de agosto, em São Paulo, a entidade programou um painel específico para debater o tema em profundidade, com a participação de diversos especialistas.
Isso porque, mais do que as diferenças com relação ao trabalhador das grandes cidades, há que se considerar também, numa provável e necessária revisão na legislação trabalhista do campo, a grande diversidade regional existente no Brasil. É quase impossível analisar as necessidades do setor rural como se ele fosse um só em todo o País. Não é. As atividades e peculiaridades de um produtor de uvas de Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha, é completamente diferente de um sojicultor de Sorriso, no Estado de Mato Grosso, ou de um cafeicultor de Guaxupé, no sul de Minas, ou ainda de um produtor de palma no interior do Pará. Mais diferentes ainda, são os cinturões de hortícolas em volta das cidades. É preciso entender, portanto, que esses são mundos completamente diferentes em termos climáticos, fundiários, tecnológicos, culturais e até mesmo étnicos. Assim, também a legislação trabalhista necessita levar em contas tais diversidades, com pena de impor condições que são inexequíveis, do ponto de vista econômico, e que podem até gerar distorções prejudiciais ao próprio trabalhador.
Tomando como exemplo apenas as diferenças de estágios tecnológicos, basta lembrar que o agronegócio brasileiro comporta desde grandes fazendas que utilizam drones, operam com nanotecnologia, sofisticadas técnicas como agricultura de precisão e máquinas com GPS, bem como aquele pequeno produtor que ainda planta com “matraca” e capina seu roçado com enxada. Um leque tão grande de técnicas produtivas, como se estivéssemos falando de países tão distintos como o Canadá e a Etiópia. Fica evidente que, tanto as políticas públicas direcionadas a crédito, seguro, preço de garantia, quanto as leis trabalhistas, precisam considerar toda essa variedade de condições existentes no País. Ao lado de uma política articulada voltada a solucionar o grande nó logístico enfrentado pelo agronegócio na hora de escoar a sua produção, mecanismos legais de modernização e flexibilização das leis trabalhistas no campo são primordiais para que o setor agrícola possa continuar sustentando sua posição de responsável pela geração de mais de um quinto do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, além de gerar um terço dos empregos do País e responder pela metade de seu saldo comercial.