Com a reforma tributária constantemente postergada, o Brasil segue entre os campeões mundiais em complexidade tributária, o que ajuda a aumentar o estoque de processos judiciais entre fisco e contribuintes. Conforme estimativa mais recente, do fim de 2020, o contencioso tributário administrativo e judicial brasileiro é de R$ 5,4 trilhões, o equivalente a 75% do PIB daquele ano. Há ações na Justiça que se arrastam por 20 anos ou mais.

O valor envolve processos administrativos e judiciais das esferas federal, estadual e municipal. Não há situação igual em nenhum país do mundo em que o contencioso ultrapasse a metade do PIB, diz o consultor tributário Everardo Maciel, ex-secretário da Receita Federal. Segundo ele, há cerca de 80 milhões de processos em tramitação.

Apesar de os dados serem de três anos atrás, o quadro não muda muito, pois no período não houve alteração significativa no sistema tributário. Segundo tributaristas, o imbróglio atrapalha o desenvolvimento econômico e afeta a decisão de investimentos de empresas, em especial de multinacionais.

Pesquisa da Comissão Europeia com multinacionais sobre o que levam em conta quando consideram investimentos, o segundo tema mais relevante foi a incerteza tributária.

INSEGURANÇA. Para Gustavo Brigagão, advogado tributarista e presidente do Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa), a morosidade do Poder Judiciário cria forte insegurança jurídica e afasta investimentos. Segundo ele, o investidor quer colocar seu capital em um país que tenha um mínimo de segurança e regras estáveis.

“Temos um cenário que demonstra impactos para a economia de um grande contencioso e de um sistema tributário incerto e complexo”, diz Raphaela Mathiessen, pesquisadora do Insper. “Precisamos de uma melhoria do ambiente como um todo, não só do Judiciário, mas em todos os passos entre fisco e contribuinte que possam trazer mais segurança e mais certezas.” Ela cita também a necessidade de julgamentos ágeis e alternativas à busca pelo Judiciário.

O caso mais recente de um contencioso que se arrastou por mais de duas décadas é o da exclusão do ICMS da base de cálculo da contribuição para o PIS/Cofins. Conhecido como a “tese do século”, começou em 1998 e só foi julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em setembro passado. A União terá de pagar cerca de R$ 250 bilhões às empresas que recorreram à Justiça.

O relatório Diagnóstico de Contencioso Judicial Tributário, do Insper, identificou que o contencioso tão relevante e moroso do Brasil tem a ver com a estrutura e o funcionamento do Judiciário e com questões externas, como a relação entre o fisco e os contribuintes, falta de orientação e de transparência nessas relações e falta de clareza sobre a interpretação da legislação. O estudo defende a necessidade de melhoria do ambiente tributário para reduzir sua complexidade e a melhoria da governança tributária, entre outras.

Everardo Maciel defende ampla modernização do sistema tributário – como na Espanha -, que inclua ajustes na tributação para efeitos de mudanças climáticas e novas fontes de financiamento do seguro social. Para ele, a PEC 110 “é ridícula”. “Fundir impostos não é simplificar; não resolve os problemas de hoje e cria outros”, diz, ao se referir à PEC 110.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.