No início da década de 1970, um grupo de aventureiros começou a desbravar o Cerrado brasileiro. Entre eles, o primeiro presidente da Embrapa, Alysson Paulinelli. Nas grandes planícies de Goiás, que ainda não havia sido separado de Tocantins, começaram a descobrir os encantos e as oportunidades daquela terra. Em meio à acidez do solo, apenas o capim braquiária sobrevivia na inóspita região. Mais de 30 anos depois, porém, o Estado se tornou um dos principais destinos do agronegócio brasileiro. Diversificado, é o terceiro maior celeiro de grãos e maior produtor de milho. Nos últimos três anos, mais de 50 projetos de usinas de álcool e açúcar chegaram por aqueles lados. Os confinamentos simplesmente explodiram. Só na região do Vale do Araguaia, localizado na região oeste, há mais de 60 pivôs irrigando pastos, na maior concentração do País. Segundo o analista de mercado Fabiano Tito Rosa, da Scot Consultoria, o nome desse sistema de produção poderia mudar para “GOnfinamento”, em alusão ao nome do Estado. De acordo com estimativas, Goiás deve concentrar aproximadamente 40% de toda a produção intensiva de gado no Brasil, algo em torno de um milhão de cabeças. Com isso, a região vem se tornando uma grande área de entressafra. E não é apenas na pecuária.

A máquina que corta o campo de trigo nesta página pertence ao Grupo SLC Agrícola, que se instalou em Goiás no início da década de 1980, quando a ciência começava a vencer os desafios do Cerrado. “Hoje, temos uma área de 3.600 hectares irrigados, produzimos café de qualidade superior, além de trigo irrigado, e essa viabilidade só encontramos em Goiás”, diz o diretor-executivo da empresa, Laurence Gomes. Segundo ele, o regime tributário da região, no caso de sua empresa, é compensador. “Pagamos 12% de ICMS, o mesmo que em Minas Gerais, e as qualidades da região são especiais”, afirma. Hoje, a SLC Agrícola possui 11 fazendas em todo o País e a Pamplona, localizada em Cristalina, na região central de Goiás, é a mais rentável. “Temos condições de agregar muito valor naquela fazenda”, avalia.

Mas não é só a parte central do Estado que vem recebendo investimentos. No sudoeste, em Rio Verde, formouse um dos mais fortes polos produtores de grãos e aves, por causa das fartas linhas de crédito que irrigaram as plantações goianas nos últimos dez anos. O Fundo de Desenvolvimento do Centro-Oeste (FCO) é um dos principais responsáveis por esse avanço, na opinião do secretário de Agricultura, Leonardo Veloso. Em 2008, o fundo respondeu por mais de R$ 1,2 bilhão em investimentos. Por conta da crise financeira, neste ano, o total de recursos deve ficar em apenas R$ 700 milhões, segundo dados oficiais. Isso, no entanto, não freia os investimentos na porção mais central do Brasil. “Temos percebido que muitas empresas chegam aqui com seus investimentos programados e por isso a expansão tem sido tão grande”, analisa Veloso. Conhecida como a “pérola de Goiás”, a Caramuru é uma das maiores Tradings em operação no Brasil, com capital 100% nacional e investimentos agressivos .

Segundo o vice-presidente da empresa, César Borges, a infraestrutura tem sido um dos principais focos de aportes. No dia 18 de agosto, a empresa anunciou investimentos de R$ 108 milhões para a ampliação de suas unidades de processamento de grãos. Só em Itumbiara, um dos celeiros do Estado, serão mais de R$ 20 milhões. “Estamos otimistas em nossos investimentos”, diz.

Goiás, de certa forma, também se tornou uma espécie de “extensão” paulista no quesito cana-de-açúcar. Segundo dados do governo goiano, entre aprovadas e implantadas, há 84 novas destilarias em andamento. Os investimentos necessários para fazer toda essa máquina andar passam dos R$ 12 bilhões, num total de mais de 60 mil empregos permanentes. Os motivos para tamanho crescimento podem ser explicados diante dos dados de preços da terra. Segundo a analista de negócios da Agra- FNP, Jacqueline Bierhals, em comparação com os de São Paulo, os preços são muito mais convidativos. “Numa rápida comparação, enquanto o hectare de chão propício para o cultivo da cana é vendido por R$ 19 mil na região de Ribeirão Preto, em Santa Helena (GO) ele sai por R$ 8,5 mil em valores atuais”, diz.

Quem aproveitou o bom momento foi a empresa ETH Bioenergia, do Grupo Odebrecht, com três projetos greenfield (a partir do zero). “Escolhemos Goiás porque tínhamos a oportunidade de desenvolver um novo polo, sem a competição por fornecedores de cana que existe em São Paulo”, explica o presidente da companhia, José Carlos Grubisich. Para o presidente da Federação Agrícola de Goiás, José Mário Schreiner, uma das vantagens de Goiás está na integração dos diversos setores produtores de matéria-prima. “Somos fortes na pecuária, grãos – além de sermos os maiores produtores de tomate industrial”, analisa. “Isso sem falar no desenvolvimento da cana e da irrigação, que é um de nossos pontos mais favoráveis”, diz. Mas, segundo ele, para que o Estado continue crescendo é preciso melhorar a infraestrutura. “Falta energia em algumas regiões, como em Cristalina, o que limita a capacidade de irrigação”, avalia. “Mas, no geral, temos tudo para continuar crescendo, apesar de um grande endividamento do setor”, diz.

Os bastidores do crescimento

Leonardo Veloso,

Secretário de Agricultura de Goiás, diz por que o Estado se tornou o principal destino do agronegócio brasileiro nos últimos anos.

Goiás está na moda?

Não acredito que seja moda, mas sim um conjunto de fatores que fizeram nosso Estado interessante.

Como, por exemplo…

Temos uma vocação rural. Aqui dificilmente você vai encontrar algum cidadão, mesmo nas cidades, que não tenha alguma ligação com o campo, ainda que seja por algum parente ou amigo.

Mas isso não explica os investimentos…

Temos uma posição geográfica favorável, muitas terras planas e um regime de chuva bem definido. A tecnologia para se plantar ou criar no Cerrado já é totalmente conhecida. Nos últimos anos, melhoramos nossa infraestrutura.

A proximidade com outros centros ajuda?

Sim, com certeza. A região de Cristalina, por exemplo, é próxima a Brasília. Rio Verde, está na rota de São Paulo e Minas Gerais. Mesmo assim, temos outras regiões com um agronegócio muito bem desenvolvido.

E as usinas de cana, continuarão chegando ou foi apenas uma febre? Acredito que elas virão, mas em um ritmo mais moderado. O ritmo de projetos que recebemos era simplesmente assustador. Mas temos capacidade de absorver mais investimentos.

Mas o Alcoolduto, que era uma promessa, foi praticamente descartado…

Sim, é verdade. Em compensação teremos a Ferrovia Norte-Sul, que vem até a parte central do Estado e depois se divide em vários ramais. Exportaremos via Maranhão e receberemos insumos muito mais baratos, por isso estamos tão confiantes.