Na década de 1970, o tempo médio que um pintinho levava para crescer, engordar e ficar pronto para o abate, desde o seu nascimento, era de quatro meses. Hoje, o mesmo processo leva 42 dias. Por trás desse número mágico, que mais parece um “milagre da diminuição”, se esconde um sofisticado processo de melhoramento genético. E, a julgar pelas iniciativas das empresas envolvidas na evolução da espécie, em dez anos, o processo todo poderá demorar apenas 32 dias. Pode parecer um detalhe, mas isso é crucial para o setor e está diretamente ligado ao preço do milho, principal insumo na criação de aves, cuja saca passou de R$ 50 nas áreas de maior demanda da agroindústria de grandes Estados produtores, como é o caso de Paraná e de Santa Catarina. A cotação dos últimos meses chegou a quase o dobro de um ano atrás. “O melhoramento da genética animal pode ajudar a reduzir custos. Se ela for mais eficiente, traz produtividade ao sistema”, diz Jairo Arenazio, diretor geral da Cobb-Vantress para a América do Sul. A empresa americana, especializada em pesquisa genética avícola e controlada pela Tyson Foods, é uma das maiores do mundo.

Na segunda quinzena de maio, o melhoramento genético do qual Arenazio se refere ganhou um reforço no País. O Ministério da Agricultura (Mapa) liberou a importação de pintos e ovos férteis, abrindo o leque de opcões para que as empresas dedicadas ao melhoramento genético aumentem a quantidade de provas zootécnicas. A corrida é por matrizes mais eficientes. São elas que vão gerar as mães e as avós dos pintinhos de um dia, vendidos aos aviários para serem engordados. Além da Cobb-Vantrees, outras multinacionais atuam nesse nicho do topo da cadeia produtiva, como o grupo alemão Aviagen, por exemplo, com subsidiárias em 130 países e receita anual de US$ 2,1 bilhões. Elas estão de olho em grupos igualmente grandes, cooperativas do porte da Aurora Alimentos, de Chapecó (SC), que abate mais de 200 milhões de aves por ano, ou LAR, em Medianeira (PR), com abate de 125 milhões, e de gigantes globais, como BRF e Seara, que abatem quase dois bilhões de aves anualmente.


No alvo: Jairo Arenazio, diretor da Cobb-Vantress para a América do Sul, afirma que a genética tem levado a uma evolução
no rendimento de abatedouro, da ordem de 2% ao ano

Na área da pesquisa, a Cobb-Vantress, por exemplo, tem focado na busca por  aves com melhor eficiência alimentar, ou seja, maior ganho de peso diário e alto índice de rendimento de carcaça. “Temos observado uma evolução genética de até 0,2% ao ano no rendimento de abatedouro”, diz Arenazio. “Isso significa uma quantidade extra de 1,5 tonelada de carne ao mês, considerando um frigorífico médio no Brasil, com abate de 140 mil aves por dia.” O volume extra, no caso dessa empresa, pode representar um acréscimo financeiro de cerca de R$ 6,3 milhões em sua receita mensal, tendo por referência a cotação média de R$ 4,18 o quilo do frango abatido no início de junho, segundo o Instituto de Economia Agrícola (IEA). De acordo com Arenazio, embora mais de 50 atributos genéticos sejam pesquisados, o mercado de frango de corte busca por outras duas características, além de peso e conversão alimentar:  o rendimento de carnes nobres e a fertilidade. “São os cruzamentos realizados com as aves avós que originam as matrizes com os aspectos mais importantes para o seu uso final”, diz ele.

Não por acaso, o Brasil é o maior exportador de carne de frango do mundo, com 4,3 milhões de toneladas embarcadas em 2015, figurando como o terceiro maior produtor mundial, com 13,1 milhões de toneladas. Foi a tecnologia que elevou a eficiência de uma cadeia produtiva que deve fechar este ano com um Valor Bruto da Produção (VBP) da ordem de R$ 50,5 bilhões. Dados da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), indicam que, enquanto a produção de carne aumentou em 27,4%, entre os anos de 2007 e 2015, o País estocou apenas 16,1% mais matrizes, passando de 42,4 milhões de aves para 49,3 milhões no mesmo período. “Podemos continuar crescendo”, afirma Francisco Turra, presidente da ABPA. “Porque a genética sempre pode ser melhorada.” 


Tempo de crescer: para o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal, Francisco Turra, foi a tecnologia que mais contribuiu para elevar a produtividade da cadeia do frango

  Para o presidente da Aviagen América Latina, Ivan Pupo Lauandos, a pesquisa por matrizes que produzam mais pintos de corte por vida útil é uma das metas da empresa, que considera esse fator o principal ponto na redução dos custos de produção. No Brasil, por exemplo, a vida de útil de uma matriz é de cerca de 66 semanas. “O preço da matriz é de R$ 18. Se ela produz, em média, 148 pintos neste período, o custo por unidade é R$ 0,12. Se forem 138 pintinhos, o custo sobe para R$ 0,13 por unidade”, afirma Lauandos. “O melhoramento genético tem de evoluir para nos dar meio ovo a mais, por ano.”


Mais longevas: o presidente da Aviagen América Latina, Ivan Lauandos, diz que as pesquisas devem buscar por matrizes de maior tempo de vida útil, porque elas ajudam na redução de custos

É o que espera a JBS Foods, do Grupo JBS, responsável pela área de processamento de carne de frango e de suíno, cuja receita foi de R$ 18,7 bilhões em 2015. Ela tem parceria com as empresas de genética para alojar as aves avós. Osório Dal Bello, diretor Agropecuário da JBS Foods, diz que o fato da companhia realizar apenas o primeiro ciclo leva às boas parcerias. “A cadeia produtiva busca pelos melhores cruzamentos genéticos e por isso ela avança”, diz Dal Bello.

Para Milton Bortulini, gerente de Agropecuária da cooperativa Lar, que abate 340 mil aves por dia, o foco da cadeia do frango dificilmente sairá da produtividade nos próximos anos. Na Lar, o bônus por qualidade pode chega até a 50% do valor médio pago ao produtor, entre R$ 0,50 e R$ 1,05 por ave. “Uma genética de excelência, aliada à nutrição, é o que leva o avicultor à lucratividade”, diz ele. “É isso que buscamos.”

Caçador de mitos
Com um canal na internet, a seara busca se aproximar do consumidor e acabar com a desinformação sobre o frango

A carne de frango é um alimento constante na mesa do brasileiro. Há dois anos e meio, de olho nesse mercado, o grupo JBS, que pertence à holding J&F, aumentou a sua aposta no setor ao comprar a marca Seara por R$ 5,8 bilhões, até aquele momento uma companhia do grupo Marfrig. Nos Estados Unidos, desde 2009, a JBS já era dona da Pilgrim’s Pride, adquirida à epoca por

US$ 2,8 bilhões.  A tacada tem um motivo claro: o consumo de carne de frango tem crescido nos últimos anos e a tendência permanece positiva. De acordo com a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), o consumo per capita anual, no País, atinge 43 quilos e, até 2025, serão cerca de 55 quilos, 27% acima do patamar atual. Desde que assumiu a empresa, o JBS tem investido na gestão do negócio, principalmente visando o aumento da exposição da marca, em busca de mais clientes. No mês passado, para abrir um canal direto com o consumidor, a empresa lançou a plataforma digital “Hoje tem frango” (www.hojetemfrango.com.br), como fez em abril para a carne bovina. “Queremos mostrar as possibilidades da carne de frango e como ela é produzida por nós”, afirma o presidente da JBS, Wesley Batista (foto).

O site foi aberto ao público com cerca de 300 receitas para o preparo de pratos e uma das estrelas convocadas para mostrar técnicas e dicas de preparo de cortes é o chef Alex Atala, dono de restaurantes estrelados como o D.O.M. “O frango está em todas as mesas”, afirma Atala. “É universal, saboroso”.  No entanto, o que mais interessa ao JBS são os acessos dos consumidores a dois bancos de informações do site, um para mostrar a cadeia produtiva da ave, “Do campo à mesa”, e outro chamado de “Mitos e verdades”, onde serão abordados temas delicados para a cadeia produtiva, como o senso comum de que a indústria avícola utiliza, por exemplo, hormônios na criação. “As pessoas se deparam com muitos mitos que não condizem com a realidade da nossa produção”, afirma Wesley.  “Queremos mostrar a realidade do que se está produzindo.”

O presidente da ABPA, Francisco Turra, diz que a campanha da JBS é inteligente e ousada. “Estamos em um momento desafiador, mas eles estão mostrando que a qualidade do produto que oferecem é muito maior que a crise”, diz Turra. A Seara abate diariamente 5,6 milhões de aves, em 34 frigoríficos.