10/04/2018 - 10:00
Plantar e colher grãos são tarefas fáceis para o produtor rural brasileiro. Difícil mesmo é guardar a colheita até o momento de embarque ou da melhor hora para a venda. Esse é um transtorno que se arrasta ano após ano, quase sem solução. Não por acaso, em todo o período de colheita, como ocorre nesses primeiros meses do ano, cenas de grãos a céu aberto têm se tornado comum, mostrando o tamanho de um problema que poderia ser resolvido com planejamento. Mas não é o que se vê. Desde a safra 2013/2014, quando o governo anunciou o Programa para Construção e Ampliação de Armazéns (PCA), até os dias de hoje, o aumento da capacidade do País em guardar os grãos praticamente não saiu do lugar. Isso porque os recursos em crédito para financiar o setor, que naquela safra foi de R$ 1,4 bilhão, no ciclo atual é de R$ 1,6 bilhão. Com pouco dinheiro na praça, a armazenagem que era de 142 milhões de toneladas cresceu para apenas 162,8 milhões, aumento de 14,6%, de acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Por outro lado, a produção de grãos, que era de 161 milhões de toneladas, está prevista em 225 milhões nesta safra, um aumento de 39,8%. “O produtor quer plantar, colher bem e entregar a riqueza gerada para um terceiro, seja trading, cerealista, cooperativa ou indústria”, diz Anastácio Fernandes Filho, presidente da Kepler Weber, de Panambi (RS), maior fabricante brasileira de equipamentos de armazenagem. “Sem armazém para guardar a colheita, o produtor precisa se livrar dos grãos e vende a qualquer preço, pagando um frete de alto valor.”
Na safra 2016/2017, a capacidade de armazenamento de grãos representou 68,2% do volume colhido, segundo levantamento da Conab. Isso significa que faltou estocar 76 milhões de toneladas. Mas se os critérios internacionais fossem seguidos, o resultado seria ainda pior. Para a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO, da sigla em inglês), o ideal é que um país tenha uma margem de segurança de estocagem de 20% acima da produção. Dessa forma, o gargalo da última safra passa para 123,9 milhões de toneladas. Nos Estados Unidos, a capacidade estática de armazenagem é 12% superior à safra de grãos, que atingiu 502 milhões de toneladas de soja e milho. De acordo com Mauro Osaki, pesquisador do Cepea/USP, há uma característica que permite entender o que ocorre por lá. Com uma política de juros baixos, atualmente de até 1,5% por ano, os produtores podem investir em infraestrutura. “É comum que cada fazenda tenha o seu próprio armazém”, afirma Osaki. “A política de estocagem vem da época da Guerra Fria com a antiga União Soviética, quando havia o temor de um ataque e de desabastecimento de alimentos.”
O que poderia ser um exemplo ao Brasil esbarra nas taxas de juros aos produtores. Os juros do PCA, que caíram um ponto percentual da safra passada para esta, estão em 6,5% por ano. Para João Bosco Azevedo, superintendente da Integrada Cooperativa Agroindustrial, de Londrina (PR), que no ano passado faturou R$ 2,7 bilhões, os produtores nem pensam em investir em infraestrutura por causa dos juros. “São as cooperativas que estão suprindo a demanda por armazenagem”, afirma Azevedo. “Nós estamos fazendo o papel do governo.” No ano passado, a cooperativa investiu R$ 40 milhões em seu complexo para armazenagem. O aumento da capacidade foi de 30 mil toneladas para um total de um milhão de toneladas. Na última safra, os cooperados da Integrada colheram 1,1 milhão de toneladas de soja e um milhão de toneladas de milho. “Por isso, mesmo com investimento, tivemos de armazenar 80 mil toneladas em silos-bolsa”, diz Azevedo.
Os silos-bolsa têm se tornado uma opção para os produtores estocarem os grãos descobertos pela falta de silos convencionais. Esse é o caso do produtor Joarez Sanches, proprietário da fazenda Limoeiro, no município de Maracaju (MS), onde ele cultiva três mil hectares de soja e milho. “Temos projeto para construir armazéns”, diz Sanches. Ele explica que uma estrutura para guardar 175 mil sacas de 60 quilos de soja custa R$ 8,5 milhões. A compra de silos-bolsa sai por R$ 0,6 por saca. O custo é de R$ 105 mil. Não por acaso, na segunda safra 2016/2017, Sanches adotou os silos-bolsa para armazenar 100 mil sacas de grãos. O motivo é simples. “Se fosse alugar armazém gastaria R$ 1,5 por saca de soja”, diz ele. “Sem contar o frete de R$ 2 por saca.” Nas suas contas, tirando o custo do silo-bolsa, a economia chega a R$ 2,9 por saca colhida.
É por esse motivo que o mercado de silos-bolsa só aumenta. A safra passada, a maior da história do País, alavancou esse mercado. Foram 80 mil unidades que armazenaram 16 milhões de toneladas de grãos. Para Demian Baum, diretor da Ipesa, fabricante argentina de silos-bolsa que opera no Brasil desde 2003, o mercado segue aquecido. “A expectativa para este ano é crescer 30% no País”, diz ele. A receita da Ipesa no Brasil foi de R$ 90 milhões em 2017, com a venda de 52 mil silos-bolsa, ante R$ 40 milhões e 23 mil unidades em 2016. Hoje, a empresa detém 62% do mercado nacional. O negócio só não está mais aquecido porque há resistência por parte dos produtores. Há uma desconfiança da durabilidade do produto estocado. “Dá medo guardar por mais de um ano os grãos em silos-bolsa, porque eles sofrem ataques de animais silvestres e de aves”, diz Azevedo, da Integrada. “Para nós, eles são um paliativo.” Mas o diretor da Ipesa garante que o produto pode armazenar grãos por 18 meses, no mínimo. “O tempo de segurança chega até 36 meses”, afirma Baum. Ele aposta no mercado brasileiro, como já ocorre na Argentina, onde a empresa também domina o setor e é muito maior. Na última safra, o país guardou 60% de sua produção de grãos em silos-bolsa, volume equivalente a 73,4 milhões de toneladas. Do total de 350 mil unidades vendidas na Argentina, 300 mil foram produzidas pela Ipesa.