01/08/2012 - 0:00
Enquanto os produtores de grãos se preparam para a quebra de safra nos Estados Unidos e os de carne temem os efeitos da alta dos insumos, o Banco do Brasil registra uma procura acima da do ano passado para os recursos da safra 2012. O banco aumentou o volume de recursos para R$ 55 bilhões e reduziu os juros para, no máximo, 5% ao ano. “O crédito está mais barato neste ano”, disse à DINHEIRO RURAL o vicepresidente de agronegócios do banco, Osmar Dias. “Considerando a tradição de pagar juros altos na agricultura, é uma grande mudança . ” Ex-senador pelo Paraná, Dias é do ramo: formado em agronomia, ele é dono de uma fazenda de 700 hectares em Goierê, no interior do Estado, onde produz soja, milho e trigo e cria gado.
DINHEIRO RURAL – Como está a procura pelos recursos do Plano Safra 2012/2013?
OSMAR DIAS – Na primeira semana após a apresentação do plano, já tivemos um desembolso de R$ 600 milhões, o que é bastante significativo. No ano passado, tivemos muita procura, e fechamos com um desembolso de R$ 48,2 bilhões, acima do orçamento inicial de R$ 45,7 bilhões. Neste ano, antecipamos para fevereiro a liberação do précusteio, e pela demanda deu para sentir que vamos ter uma boa procura por crédito, por causa da redução das taxas e pela boa perspectiva de preços para os grãos.
DINHEIRO RURAL – Havia procura por mais recursos? Houve gente que não foi atendida no ano passado?
DIAS – Não, nós conseguimos atender todos. Aumentamos a participação do Banco do Brasil (BB) de 59% para 64% no mercado de crédito agrícola. As linhas que mais cresceram foram as de investimento: construção de instalações como aviários, pocilgas, cercas, investimento em pastagens. O programa ABC, de agricultura de baixo carbono, que adotamos como prioridade, teve um desembolso de R$ 1,2 bilhão para recuperação de pastagens e de florestas. Tivemos também um crescimento de 48% no Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural (Pronamp).
DINHEIRO RURAL – O orçamento de R$ 55 bilhões será suficiente para este ano?
DIAS – Se não for suficiente, temos um compromisso de ampliar, mas levando em conta as prioridades do governo. Podemos ampliar em agricultura familiar, para médio produtor, agricultura de baixo carbono e para os grandes produtores, nas linhas de investimento. Desse orçamento, 93% são recursos controlados, com taxas que variam de 5,5% ao ano para o grande produtor, a 5% para o médio e as linhas de investimento, com juros de 5%. Na agricultura familiar, o juro varia de 0,5% a 4%. Para atender os megaprodutores, acima do limite permitido com as taxas subsidiadas, fazemos um mix e cobramos juros menores do que os do mercado.
CRÉDITO FÁCIL: produtores, como os do cinturão verde de São Paulo, podem usufruir de taxas com juros menores
DINHEIRO RURAL – O aumento da fatia do Banco do Brasil no mercado não estaria ocorrendo porque os bancos privados estão com menos recursos?
DIAS – No ano passado, o governo colocou R$ 105 bilhões no Plano Safra. Neste ano, colocou R$ 134 bilhões. Alguns bancos estão crescendo no mercado, assim como as cooperativas de crédito. A disputa com esses bancos é na faixa dos médios para cima. O BB atendeu a 76% do Pronaf (agricultura familiar), no ano passado.
DINHEIRO RURAL – A redução dos juros representará um incentivo importante para o mercado?
DIAS – Considerando a tradição de pagar juros altos na agricultura, é uma grande mudança. A taxa caiu de 8,75% para 6,5%, e agora para 5%. O crédito está mais barato neste ano.
DINHEIRO RURAL – E como está a inadimplência do setor?
DIAS – Diferentemente do que se costuma propagar, em uma carteira de R$ 94 bilhões, a inadimplência do banco do Brasil é de apenas 0,6%. É a inadimplência do agronegócio que puxa a inadimplência do banco para baixo. Há um ano, quando eu cheguei, era de 2,7%. Fizemos alguns planos de recuperação de crédito. Antes, produtores que tinham renegociado dívida não podiam pegar crédito novo. Agora, desde que estejam pagando em dia, podem tomar novos empréstimos. Com isso, trouxemos 50 mil produtores de volta para o mercado. Cerca de 90% dos clientes atuais são nível A e B. Temos 1,5 milhão de contratos: 1,2 milhão de produtores familiares e 300 mil produtores médios. Outra coisa que reduziu a inadimplência foi o nosso incentivo ao seguro. Não podemos obrigar, mas orientamos o produtor a fazer seguro. Até março, 58% do nosso crédito de custeio era segurado. Foi isso que evitou um desastre com a seca no Sul. Quando assumi o cargo no BB, já sabíamos que neste ano teríamos La Niña, por isso carregamos no seguro no Sul. Temos de usar a tecnologia a nosso favor.
DINHEIRO RURAL – O bom pagador não merecia algo diferenciado em seu relacionamento com o banco?
DIAS – Minha proposta, que ainda não foi aceita pelo governo, é criar um crédito rotativo de cinco anos. Seria a inovação do crédito rural, porque o tornaria mais barato e mais simples, com redução de burocracia, tanto para o banco quanto para o produtor. Seria igual ao cartão de crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES ), que vai sendo recarregado conforme a pessoa vai pagando o empréstimo.
DINHEIRO RURAL – A cobertura do seguro está aumentando este ano?
DIAS – Sim, pois temos dois fatores: a vontade do produtor e a subvenção do governo.
DINHEIRO RURAL – Mas o seguro ainda é muito caro para o produtor.
DIAS – É caro porque poucos no Brasil fazem. Se muitos fizessem, seria mais barato, porque o risco seria diluído. Minha proposta, que não foi aceita pelo governo, era oferecer uma taxa de juros menor para quem contrata o seguro. Ainda vou lutar para que isso aconteça um dia. Eu acho que sai mais barato a subvenção do que depois socorrer o produtor com prejuízo.
DINHEIRO RURAL – Se todo mundo quiser seguro não vai ter subvenção para isso, vai?
DIAS – Não, o governo tem de aumentar a subvenção. Já aumentamos, em relação ao ano passado, de R$ 260 milhões para R$ 400 milhões, mas precisamos aumentar ainda mais. Há duas coisas em que o governo precisa investir: seguro e assistência técnica. Se o produtor tiver assistência técnica ele vai fazer o seguro. É a assistência técnica que vai dar o novo salto de produtividade na agricultura do País. De 1990 para cá a produtividade cresceu muito, mas já não cresce como antes. Eu fiquei feliz, porque depois de a gente falar muito, ouvi a presidenta Dilma Rousseff anunciar a criação de uma nova agência de assistência técnica. Isso vai ajudar muito a levar esse crédito com qualidade para o produtor. Temos recursos para estimular a produção em áreas degradadas, mas quando cheguei no BB não tínhamos nenhum projeto liberado, porque não havia nenhum técnico treinado.
SECA: produtores já perderam quase tudo neste ano, como ocorreu no Nordeste, por falta de seguro rural
DINHEIRO RURAL – Muitos produtores tomam crédito nas tradings, que financiam a produção e compram o produto antecipado. Isso está diminuindo com a entrada do banco mais forte no mercado?
DIAS – A participação das tradings já chegou a 20%, hoje está em torno de 15%, 16% do crédito. É o resultado da atuação do Banco do Brasil e da criação de alternativas de crédito além do limite das linhas com juros controlados. Nós fazemos uma taxa de juro que não é a controlada, mas também não é como das tradings, que às vezes chega a até 18%. E isso é impagável pela agricultura.
DINHEIRO RURAL – O Banco do Brasil tem programas específicos para o etanol?
DIAS – Temos duas linhas, para usinas e para produtores. Só que até agora não houve demanda. É uma linha do BNDES, e nós temos de cumprir as regras do banco. É preciso desburocratizar. O setor de álcool está passando por um momento difícil, então não é todo mundo que consegue tomar crédito. Nós temos recursos, mas o produtor só vai investir quando tiver certeza do retorno. E hoje ele não tem essa garantia.
DINHEIRO RURAL – Qual o cenário dos próximos meses para o produtor brasileiro?
DIAS – Não podemos esperar que os preços atuais permaneçam, mas certamente vão continuar remuneradores. De acordo com as previsões, a estiagem nos Estados Unidos vai levar a uma quebra de safra de soja e milho, o que deve manter em alta o preço desses produtos. O cenário é bom para o produtor de grãos. Os outros é que vão sofrer, porque soja e milho são, justamente, a base da produção de carne. Hoje, a suinocultura está em crise, a carne bovina não está remunerando o produtor. O governo tem de se preparar para crises setoriais nos próximos meses.