04/06/2018 - 10:00
O livro O Exportador, escrito em 1999 pelo economista italiano Nicola Minervine, sobre marketing internacional, dedicou um capítulo inteiro à empresa brasileira Guarany, fabricante de equipamentos para a agricultura, de combate a incêndio e corantes. Sediada em Itu, no interior paulista, a empresa foi considerada por Minervine um modelo de internacionalização. A escolha se deve ao trabalho da engenheira química Alida Maria Fleury Bellandi, 64 anos, que assumiu a presidência da companhia da família em 1999. Sua trajetória até o topo foi longa No fim dos anos 1970, quando Alida começou organizar e liderar as operações internacionais, a Guarany abriu as portas para o mercado externo. Hoje, com 95 anos de fundação, a empresa está presente em 70 países. “Temos uma estrutura consolidada na América Latina, nos Estados Unidos, na Inglaterra, na Nova Zelândia, na Austrália e na África”, afirma Alida. “E continuamos abrindo mercado, como no sudeste asiático.” No ano passado, a receita da empresa foi de R$ 100 milhões, um aumento de 3% ante 2016. A meta para este ano é crescer 5%. Alida abriu espaço no mundo corporativo em uma época e em uma área na qual a presença de mulheres executivas no alta escalão era mais rara do que nos dias atuais. Não por acaso, ela já está escalada para ser uma das palestrantes no 3º Congresso Nacional das Mulheres do Agronegócio, que acontece em outubro na capital paulista. O tema do debate será “2030 – O Futuro agora, na prática”. No ano passado, cerca de 1,2 mil mulheres do setor participaram do evento.
Para o professor José Luiz Tejon Megido, coordenador do Núcleo de Agronegócios da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), em São Paulo, há atualmente um grupo atuando no agronegócio que possui características similares. São pioneiras, líderes ousadas e focadas em processos. Elas geram empatia, possuem abertura mental e predisposição ao risco. “Esse tipo profissional merece respeito por suas entregas de alta performance”, afirma Tejon. “É excelente na convivência e possui consciência da liderança além das portas da sua própria área de atuação.” No caso, Alida preside o Conselho de Administração da Câmara de Comércio Argentino Brasileira, é membro do Conselho Nacional da Indústria de Máquinas da Abimaq e integra a Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria.
A Guarany possui atualmente 340 funcionários. Para Alida, o grande desafio é ter várias gerações trabalhando juntas, com métodos, sistemas e visões diferentes. Com essa tática, ela tem alcançado bons resultados. A média de permanência dos funcionários na Guarany é de 20 anos, muito acima da média nacional, que é de cerca de três anos, segundo o IBGE. “Os funcionários ficam porque têm envolvimento e comprometimento”, afirma Alida. “Tenho muito orgulho do nosso pessoal.” A executiva usa a experiência da própria família, de perseverar e não largar mão do propósito inicial para se espelhar. O avô, o químico italiano Ítalo Bellandi, da região da Toscana, fundou a empresa em 1923 para produzir corantes para tecidos. A partir dos anos 1940 que a empresa passou a fabricar um tipo de pulverizador doméstico e os agrícolas.Um novo impulso da Guarany somente ocorreu com a chegada da terceira geração da família ao comando dos negócios. Foi a partir da década de 1970 que o irmão de Alida, Carlos Alberto, passou a cuidar da parte financeira. Ela assumiu a área de globalização e de marketing. Na época, tinha 24 anos e era funcionária do Midland Bank no Brasil, instituição inglesa com sede em Birmingham. “Pedi licença por três meses, mas acabei ficando na Guarany”, afirma a executiva.
A aposta de Alida no negócio familiar se mostrou acertada. Segundo ela, sua carreira sempre foi inspirada em uma visão holística. “Na Guarany, não há distância entre o operário, o diretor e a presidente. Não há chefia, mas sim lideranças e trabalho em equipe”, afirma ela. “A transparência é ponto chave para os funcionários terem confiança.” Muito segura daquilo que acredita, durante toda a reportagem da DINHEIRO RURAL Alida reforçou seus conceitos de administração de equipes. Para ela, há três fatores que importam ao capital humano. O primeiro é seguir o que está na lei trabalhista. O segundo é proporcionar caminhos para que as pessoas se desenvolvam, como cursos de idioma, especializações e participação em feiras e eventos. O terceiro, para ela o mais importante, é criar uma cultura de convivência e de motivações para que as pessoas se sintam parte de uma filosofia de vida. “O que nos dá sustentação são os princípios”, afirma ela. “A Guarany tem plano de participação nos lucros e resultados, e acredita no poder em compartilhar.”
Ligada em temas de sustentabilidade, Alida já elaborou vários projetos nos quais o objetivo foi desenvolver o capital humano naquilo que mais acredita. Ela já criou um bosque no qual cada funcionário tem a sua própria árvore. Também já desenvolveu um projeto para filhos de funcionários e cinco mil crianças de escolas públicas que durou quatro anos. Mas um dos projetos mais vistosos é com comunidades indígenas na região do Xingu, no noroeste do País, que já ganhou vários prêmios internacionais, com foco no combate a incêndios.