01/02/2008 - 0:00
Dono de uma das maiores cargas tributárias do mundo, estima-se que o Brasil arrecade cerca de R$ 550 bilhões por ano em impostos, o que representa 36% do PIB. Segundo estudo realizado pelo coordenador científico do Centro de Estudos Avançados em Economia (Cepea), Geraldo Barros, desse total, cerca de R$ 103 bilhões são arrecadados pela cadeia do agronegócio, valor que representa 18% do PIB do setor. Isso significa que, em média, para cada 100 sacas de soja, 18 ficam para o governo como pagamento de tributos. Para a realização desta reportagem, DINHEIRO RURAL entrou em contato com diversos produtores País afora e todos foram unânimes em afirmar que é quase impossível avaliar, exatamente, quanto se paga de imposto no País. Isso porque, dependendo do Estado, há diferenças que vão desde cobranças municipais até o ICMS, que também varia de acordo com o Estado e a cultura. Independentemente das variações existentes, o fato é que o produtor rural está prestes a pagar um pouco mais. Isso por causa do recente aumento na alíquota do IOF, Imposto sobre Operações Financeiras, que passou de 1,5% para 3% ao ano, realizado para suprir parte da arrecadação que vinha da CPMF, que deve gerar impacto no campo. Segundo Barros, a mudança deve atingir principalmente as operações de crédito rural. A previsão é de que 2,6% a 4% dos R$ 8 bilhões arrecadados com o aumento da IOF sejam gerados pela agropecuária, um valor que pode chegar a R$ 320 milhões. “É certo que tal medida vem num momento desfavorável, em que custos e preços agropecuários estão em alta, trazendo sérias preocupações a respeito de seu efeito sobre a inflação”, comenta o professor.
O aumento do IOF não foi o único impacto sentido pelo campo. Aliás, o setor agrícola foi uma das maiores vitimas dos efeitos colaterais causados com o fim da CPMF. Por conta da perda de receita com o imposto, recentemente o governo anunciou o adiamento de um programa de renegociação de dívidas agrícolas estimadas em R$ 120 bilhões. O setor sucroalcooleiro viu ser cancelada a implantação de um pacote fiscal, negociado há mais de um ano, que previa a redução de PIS/Cofins e IPI sobre equipamentos para novos projetos de co-geração de energia a partir de biomassa.
A grande quantidade de impostos e o complicado sistema tributário, com valores que variam dependendo da região e do tipo de atividade, tornam praticamente impossível para o produtor calcular quanto exatamente ele paga ao Fisco. Até porque, além dos impostos diretos, que incidem sobre a sua atividade, o produtor acaba pagando também tributos indiretos, embutidos, principalmente, nos preços dos insumos e na hora de comercializar e transportar o seu produto.
RENEGOCIAÇÃO: impostos sobre dívidas de sojicultores custarão R$ 36 milhões
TRANSPORTE: milho sofre com o custo do transporte, bitributado por causa dos pedágios e IPVA
BAGUNÇA: excesso de tributos sobre a atividade confunde produtores, que não sabem quanto gastam em impostos
MORDIDA A MAIS: aumento do IOF irá aumentar a carga tributária sobre o setor sucroalcooleiro, principal prejudicado
BITRIBUTAÇÃO: transporte de animais de um Estado para outro, somado a tributos dos frigoríficos, faz o setor pagar mais de uma vez pelo mesmo produto
Esse é justamente o caso do produtor de algodão e milho Celito Missio, que já desistiu de fechar essa conta. “Além de impostos diretos como o Funrural, ICMS, IR, eu pago também impostos indiretos embutidos na compra de insumos e com transporte. Tudo acaba sendo repassado ao produtor, que é o último da cadeia”, desabafa. Produzindo no município de Luis Eduardo Magalhães (BA), em uma área de 2.500 hectares, onde também cultiva milho e soja, Missio, apesar de não saber o valor exato, afirma que os impostos representam uma parcela grande do seu custo de produção. “Só de Imposto de Renda pago cerca de 20% do meu faturamento”, conta.
DIFERENÇA – Outro fator que torna difícil calcular o tamanho da mordida do Fisco são algumas particularidades de cada produção. Um dos exemplos disso está na pecuária, como explica o diretor técnico da consultoria Agra/FNP, João Vicente Ferraz. “Um pecuarista que comercializa seu gado de um Estado para outro está sujeito à tributação. Agora, se ele comercializa direto com um frigorífico, quem arca com o imposto é o frigorífico, que muitas vezes recebe isenção fiscal, como no caso de ser exportador”, conta o consultor, que acredita que a carga tributária fique com boa parte dos ganhos dos produtores. “Acredito que de forma geral, em média, 5% do faturamento bruto do produtor seja destinado à carga tributária.”
Essa conta fica ainda mais pesada quando se leva em consideração que, apesar da grande arrecadação, o País não consegue oferecer as contrapartidas esperadas pelo contribuinte. No caso do setor agrícola, a melhoria de estradas, portos e toda a infra- estrutura necessária para um país com a produção agrícola do Brasil. Um exemplo disso é o frete, que tem seu preço encarecido em boa parte devido ao mau estado de conservação das estradas ou aos pedágios instalados nas rodovias geridas pela iniciativa privada. Ou seja, acaba-se pagando duas vezes pelo mesmo serviço.
“Pagamos muitos impostos embutidos nos insumos e isso sobrecarrega o agronegócio”
CELITO MISSIO, cotonicultor e produtor de milho
CUSTO – Para o presidente da Associação dos Produtores de Soja do Estado de Mato Grosso (Aprosoja), Glauber Silveira, o peso dos impostos pode ser medido pelo custo de renegociação da dívida dos produtores no Estado. “Hoje os produtores de Mato Grosso têm uma dívida de R$ 6,7 bilhões. A renegociação custará cerca de R$ 36 milhões só em impostos.” Produtor de soja no município de Campo de Julio, com uma área de 12 mil hectares, Silveira destaca que boa parte das 500 mil sacas de soja que produz por safra é exclusivamente para o pagamento do Fisco. “Hoje, de cada 50 sacas que produzo, 18 vão para o pagamento de impostos. Os tributos representam cerca de 40% do meu custo de produção”, afirma. Nem a expectativa da realização de uma reforma tributária no País parece trazer boas notícias para o setor. Uma das medidas que podem ser incluídas no texto de uma eventual reforma é a criação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA). Para o professor de Planejamento Tributário do Ibmec, Gilberto Braga, caso se torne realidade, esse imposto deve causar impacto direto ao setor. “A criação desse imposto sempre é discutida quando se fala em reforma tributária. O IVA pode afetar principalmente a agroindústria”, pondera o representante.
Eduardo Savanachi