12/06/2024 - 13:15
Nesta terça-feira (11/06) o governo federal decidiu anular o leilão realizado na quinta-feira da semana passada pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), cancelando assim a compra de 263,3 mil toneladas de arroz – de um total de 300 mil toneladas ofertadas inicialmente.
O evento chegou a ser suspenso na véspera, após recurso judicial de produtores e parlamentares da oposição, mas acabou sendo autorizado pela Justiça Federal. O plano era fazer uma segunda rodada, no próximo dia 13, para adquirir as 36,63 mil toneladas restantes.
As vencedoras do processo receberiam recursos do governo para importar o arroz e entregariam o produto à Conab. O cancelamento foi decidido após suspeitas de irregularidades envolvendo o certame.
O governo justificou a anulação da operação, dizendo ter encontrado indícios de incapacidade técnica e financeira de algumas das empresas vencedoras, afirmando que pretende fazer um novo leilão “mais ajustado” e que publicará um novo edital para importar o arroz.
Novo leilão
Visando evitar novas irregularidades, a Advocacia-Geral da União (AGU) e a Controladoria-Geral da União (CGU) foram chamadas para participar do processo de revisão do novo leilão, para que a análise das empresas participantes ocorra antes da operação.
“O presidente Lula participou dessa decisão de anular esse leilão e proceder um novo leilão, mas aperfeiçoado do ponto de vista de suas regras, por isso que a CGU e AGU participarão, e a Receita Federal também, da elaboração desse novo leilão, juntamente com a Conab para garantir que ele esteja em outras bases”, disse o ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira. “Nós vamos proceder um novo leilão, não haverá recuo dessa decisão tendo em vista que é necessário que o arroz chegue na mesa do povo brasileiro a um preço justo”, acrescentou.
O governo tem pressa, e por isso, a publicação do novo edital é esperada já para a próxima semana.
Preço do arroz em alta
A importação do arroz visa tentar segurar o preço do cereal nos supermercados e compensar perdas na safra provocadas pelas enchentes no Rio Grande do Sul. O estado é responsável por 70% da produção nacional de arroz e já havia colhido 80% do cereal antes das inundações.
Entretanto, a cheia também atingiu grãos estocados e prejudicou o escoamento da produção, por causa da interdição das estradas. As atuais dificuldades de logística para levar o cereal ao resto do país causam encarecimento do frete, impactando no preço final do produto.
Os preços do produto no mercado interno tiveram uma alta média de 14%, chegando em alguns lugares a 100%, após as inundações no Rio Grande do Sul.
Na prévia da inflação de maio, o preço do arroz ao consumidor acumula alta de 25% em 12 meses, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Plano é vender grão por R$ 4 o quilo
O plano do governo é vender o arroz importado ao consumidor final em pacotes de 5 quilos, por preço tabelado de R$ 20 – R$ 4, o quilo –, e com o rótulo padronizado do governo na embalagem. Nos supermercados de SP, o pacote de 5 quilos tem sido vendido atualmente a uma média de R$ 30.
A decisão para importação do arroz já havia sido tomada poucos dias depois do início das cheias. No início de maio, o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, afirmou que a compra do arroz pelo governo visava evitar alta de preços face aos problemas que o Rio Grande do Sul passava para transportar o cereal para o resto do país.
Suspeitas de irregularidade
Foi apontado que três das quatro vencedoras não pertencem ao ramo de arroz ou de importação, o que poderia acabar gerando problemas na operação, de acordo com analistas. Entre as empresas que venceram, constavam uma loja de queijos, uma fábrica de polpa de frutas e uma empresa de locação de veículos e máquinas. Todas elas, entretanto, têm o comércio de produtos alimentícios como atividade secundária.
Segundo Conab, no modelo de leilão que foi realizado, a estatal só sabe quem são as vencedoras após os resultados da operação. Isso ocorreria porque a intermediação das negociações é feita pelas bolsas de cereais.
Suposto favorecimento
O leilão também foi criticado por um suposto favorecimento de empresas ligadas a um ex-assessor parlamentar do secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Neri Geller. Na terça-feira, 11, o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, anunciou a saída de Neri Geller do posto. Segundo o ministro, Neri Geller colocou o cargo à disposição do governo e foi demitido.
Oposição e associações de produtores alegam que houve favorecimento no processo de leilão. O ex-assessor nega.
A Bolsa de Mercadorias de Mato Grosso (BMT) e a Foco Corretora de Grãos, duas empresas de Robson Luiz Almeida França, ex-assessor de Geller, intermediaram a venda de 44% do arroz adquirido pela Conab. Além disso, outra empresa do mesmo Robson França têm como sócio Marcelo Geller, filho do ex-secretário.
Diante das suspeitas levantadas parlamentares de oposição iniciaram movimentações para investigar o leilão. O deputado federal Luciano Zucco (PL-RS) começou a coletar assinaturas para criar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) visando apurar as denúncias.
Batalha legal e críticas dos produtores
Mesmo antes de aparecerem suspeitas de irregularidades, o governo já havia enfrentado uma batalha judicial para conseguir colocar em prática seu plano de importar arroz, motivada pela resistência dos produtores e de parlamentares da oposição.
O leilão chegou a ser suspenso pela Justiça na véspera de ocorrer, mas a decisão foi revertida após recurso da AGU.
Associações de produtores rurais criticaram os planos do governo de importar o grão, afirmando existir arroz suficiente para abastecer o país. Eles consideram a medida intervencionista e afirmam que ela constitui um desestímulo à produção nacional. A Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Fedearroz) chegou a pedir o cancelamento do leilão.
O governo respondeu que a questão não é o abastecimento, e sim o preço praticado no mercado interno. “Me perguntaram se não era precipitado. Precipitado é ter lugares onde o arroz aumentou 19%, como foi em Santa Catarina, em um mês – o segundo estado de maior produção no nosso país”, afirmou o presidente da Conab, Edegar Pretto.