13/11/2013 - 15:08
Os produtores iniciaram o plantio da safra 2013/2014 com uma única certeza: haverá, por mais um ano, sérios problemas para tirá-la do campo, por conta da logística deficiente do País. Para o economista Raul Velloso, especialista do Instituto Millenium, ex-secretário de Assuntos Econômicos do Ministério do Planejamento e Ph.D em economia pela Universidade de Yale, nos Estados Unidos, “a infraestrutura é crucial, do ponto de vista macroeconômico”. Em entrevista à DINHEIRO RURAL, o economista analisa o nível de investimento em infraestrutura no País e faz um prognóstico do que vem pela frente.
Qual é o papel da infraestrutura na economia do País?
O setor de infraestrutura tem um poder irradiador de crescimento muito grande. Se a infraestrutura é expandida e tem qualidade, todos os setores da economia vão crescer, inclusive o agronegócio. Na agricultura, em particular, é muito visível o peso da infraestrutura logística. Como tirar a soja produzida com muita competitividade em Mato Grosso, por exemplo, e mandar para a China em cima de estradas péssimas, portos ruins e um transporte hidroviário que está engatinhando?
Como o Brasil se enquadra no ranking mundial de infraestrutura?
No ranking de 144 países, o Brasil está na 107ª posição em infraestrutura geral. Na qualidade dos portos ocupa o 135º lugar e está na 123ª colocação em qualidade das estradas. Em ferrovias, vai ao 100º lugar e, em transporte aéreo, à 134ª posição.
Como fica o agronegócio nesse cenário?
Creio que falta o reconhecimento para o que o setor agrícola tem feito pelo País. Não fosse a produção agropecuária e as commodities minerais, o País estaria em uma situação muito difícil, porque a indústria brasileira é pouco competitiva em termos mundiais. Ela é o nosso ponto fraco. O agronegócio se tornou mais eficiente do que na maioria dos países de dimensão continental comparável à do Brasil, mas em infraestrutura eles provavelmente são melhores, como a Argentina, por exemplo.
O atual caos logístico no País era previsto?
Era previsível. Pelo menos há 25 anos, desde a Constituição Federal de 1988, quando o governo decidiu concentrar os recursos da União em um gigantesco programa de proteção social. Com isso, ele deixou os outros setores da economia com recursos insignificantes, como na área de transportes.
Como é feita essa distribuição de recursos?
O orçamento da União destinou quase 74% de seus recursos em benefícios previdenciários e assistenciais e em salários de funcionários. A área da saúde contou com 8%. Para todo o restante sobrou 18%. A infraestrutura, no geral, ficou com 6%. Dessa fatia de 6%, o setor de transportes teve apenas 22% em 2012. Trocando em miúdos, os recursos destinados ao transporte representam 1,3% do total de investimentos da União. Isso não é nada.
É possível projetar uma infraestrutura eficiente, no mesmo ritmo do crescimento da produção agrícola?
Sim, com duas medidas: destinar os recursos públicos com planejamento e facilitar a entrada do setor privado nessa área.
Qual é o principal ponto crítico da atual política de concessões?
É justamente não compreender o setor privado. O governo precisa entender que há uma diferença entre o possível e o imaginável. A política de menor tarifa imaginária não funciona. É preciso elaborar a menor tarifa possível, que é aquela que compete com as outras oportunidades para o setor privado. A tarifa se reflete na taxa de retorno: se é muito baixa, a taxa também é muito baixa. Se o setor privado tem a opção de fazer outro tipo de investimento com retorno mais alto, ele o faz.
O modo como é realizado um leilão faz diferença na concessão?
Sem dúvida. Atualmente, o leilão tem sido feito de forma muito precária. O governo federal não está aparelhado para fazer a sua parte. O ritual de concessão não tem pré-qualificação, indo direto para o leilão. Também não há preservação do plano de negócio, porque o governo não tem qualificação para avaliá-lo. Atualmente, essa avaliação é feita pelo banco que vai financiar. No entanto, a aprovação da concessão é realizada antes. Caso o banco conclua que o negócio não é bom, o objetivo não será alcançado, que é o de expandir a infraestrutura com qualidade.
A Empresa de Planejamento e Logística (EPL) vai resolver esse impasse?
Não acredito. A EPL, como o próprio Plano Nacional de Logística e Transporte (PNLT), caminha a pas sos lentos e, até agora, está voltada a obras de longo prazo. O PNLT existe há um ano e só agora, por exemplo, se está fazendo um edital para concessão de dois trechos da BR 163, uma estrada da qual se ouve falar desde a década de 1970.
Em que cenário deve acontecer o escoamento da safra nos próximos anos?
Podemos ver tudo de novo. Caos logístico e milho apodrecendo ao relento. É preciso entender que infraestrutura é crucial no ponto de vista macroeconômico. No próximo ano, o escoamento da safra vai ser, no mínimo, tão caótico quanto o registrado neste ano ou ainda pior, se a safra for maior. Afinal de contas, não teremos em menos de um ano resultados concretos, mesmo naqueles projetos em andamento que funcionarem bem. A logística do País deve começar a se movimentar somente a partir de 2015.