22/12/2022 - 15:21
Descrito por acadêmicos como um dos maiores intelectuais brasileiros da sua geração, o jurista e filósofo Silvio Almeida será o futuro ministro dos Direitos Humanos no novo governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Um dos principais nomes na área e conhecido como um estudioso, Almeida terá o desafio de conciliar uma pauta de governo que foi alvo de denúncias por ONGs durante os quatro anos de Jair Bolsonaro no Executivo.
Notado por um grande trabalho na luta antirracista, Almeida é autor do livro Racismo Estrutural (Pólen, 256 páginas), publicado em 2019 e um dos trabalhos mais influentes sobre o tema, é doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP), presidente do Instituto Luiz Gama e do Centro de Estudos Brasileiros do Instituto para Reforma das Relações entre Estado e Empresa (IREE).
“Silvio Almeida é uma das mais importantes referências dos direitos humanos que temos hoje no Brasil. É uma pessoa que tem uma visão extremamente moderna e contemporânea”, diz Rogério Sottili, diretor executivo do Instituto Vladimir Herzog.
Pedro Serrano, professor de Direito da PUC-SP, acredita que Silvio Almeida enfrentará uma “grande dificuldade”, mas que poderá ser superada. “Ele terá que lidar com um tema que uma parcela da sociedade brasileira compreende muito mal. Esse trabalho não é importante para ele, mas para a consciência da sociedade que os direitos humanos são uma relação civilizada entre Estados e pessoas e não para defender bandido”, disse.
Para Serrano, Almeida defende os direitos humanos “como um solo comum entre direita e esquerda”. “Não conheço nome melhor do que ele”, afirmou.
Em novembro, o governo Bolsonaro foi alvo de nova denúncia encaminhada a relatores de Direitos Humanos e Mudanças Climáticas da Organização das Nações Unidas (ONU) formulada por cinco ONGs brasileiras. O documento aponta dados de desmatamento na Amazônia e no Cerrado e de violência contra povos indígenas para sustentar que a atual gestão do País representa risco “às gerações futuras” de todo o mundo.
Silvio Almeida é filho de Barbosinha, ex-goleiro que passou pelo Corinthians em 1967, que ganhou o apelido em referência a Barbosa, que defendeu o gol brasileiro na Copa de 1950, acusado de falhar na final, em que a seleção foi derrotada pelo Uruguai. Assim como o arqueiro vice-campeão, Barbosinha ficou apenas um ano no Corinthians, após falhar em clássico contra o Palmeiras.
Foi também na relação com o pai que Almeida notou o racismo na sociedade brasileira. “Eu notei que o apelido do meu pai era por conta de eles serem negros. E meu pai não herdou apenas o apelido, mas o estigma sobre os goleiros negros”, disse o jurista em entrevista ao SporTV, em 2020.
“É como se as pessoas sempre estivessem olhando para você esperando que você cumpra a sua sina. Ou seja, que você falhe. Porque o goleiro deve ter um coisa que as pessoas geralmente não associam ao negro. E isso é racismo. Que é a confiança. Sempre há uma desconfiança”, afirmou Almeida em outra entrevista ao UOL.
Descrito por pessoas do entorno como uma pessoa humilde, Almeida também terá que agir politicamente. “Silvio tem capacidade de diálogo e trânsito em todos os espectros políticos e em todas as faixas sociais”, afirmou Yuri Silva, coordenador de Direitos Humanos no IREE e membro do grupo de transição na área de igualdade racial. “Ele é um intelectual negro que fala para os negros, para a esquerda brasileira, consegue dialogar com o centro político, e fala também para a mãe de família de classe média que assiste a Globo e que não necessariamente é de esquerda, ou às vezes é até conservadora.”
Para Gabriel Sampaio, coordenador do programa de enfrentamento à violência Institucional da Conectas Direitos Humanos e membro do grupo técnico de transição na área de Justiça e Segurança Pública, Silvio Almeida poderá trazer avanços significativos no campo de construção de políticas públicas antirracistas no Brasil.
“É fundamental que o ministério de Direitos Humanos tenha a real dimensão e adote uma postura condizente com o tamanho do desafio do enfrentamento ao racismo estrutural do Brasil. Ele (Almeida) é o melhor sistematizador sobre as origens, as dimensões do racismo estrutural no Brasil”, afirmou.